12 Novembro 2022      12:09

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O erro de Marcelo

Recentemente o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, apresentou um «aviso» público (digamos que um raspanete) à Ministra da Coesão, Ana Abrunhosa, acerca da execução dos fundos europeus.

«Não lhe perdoo» avisou o Presidente da República, «caso venha a descobrir que a taxa de execução dos fundos não é aquela que deve ser». Chegou mesmo a dizer que se não correr bem, vai ter mesmo um dia infeliz.

Concordo plenamente que o Presidente da República dê a sua opinião sobre a situação do País e que deixe alguns avisos à navegação. Para isso, tem espaço político e momentos próprios para o fazer.

No entanto, aproveitando um ato público para dar um raspanete a uma Ministra (ou um Ministro) parece-me algo absurdo. Institucionalmente errado!

Uma coisa é a oposição a fazê-lo ou dizê-lo, outra coisa é o Presidente da República. A oposição pode e deve fazê-lo, o Presidente da República claramente que não.

O Presidente da República anda praticamente há 6 anos a elogiar publicamente o governo e diretamente alguns ministros (o que me parecia claramente errado), mudou agora a agulha para dar raspanetes a ministros em público.

O tipo de poderes de que dispõe o Presidente da República pouco tem que ver, assim, com a clássica tripartição dos poderes entre executivo, legislativo e judicial.

«Aproxima-se muito mais da ideia de um poder moderador (nomeadamente os seus poderes de controlo ou negativos, como o veto, por exemplo; embora o Chefe de Estado disponha também, para além destas funções, de verdadeiras competências de direção política, nomeadamente em casos de crises políticas, em tempos de estado de exceção ou em matérias de defesa e relações internacionais).

No entanto, muito para além disso, o Presidente da República pode fazer um uso político particularmente intenso dos atributos simbólicos do seu cargo e dos importantes poderes informais que detém. Nos termos da Constituição cabe-lhe, por exemplo, pronunciar-se “sobre todas as emergências graves para a vida da República”, dirigir mensagens à Assembleia da República sobre qualquer assunto, ou ser informado pelo Primeiro-Ministro “acerca dos assuntos respeitantes à condução da política interna e externa do país”. E todas as cerimónias em que está presente, ou os discursos, as comunicações ao País, as deslocações em Portugal e ao estrangeiro, as entrevistas, as audiências ou os contactos com a população, tudo são oportunidades políticas de extraordinário alcance para mobilizar o País e os cidadãos.

A qualificação do Presidente como “representante da República” e “garante da independência nacional” fazem com que o Presidente, não exercendo funções executivas diretas, possa ter, assim, um papel político ativo e conformador.»

Para quem não gosta do governo até pode saber bem ouvir estes raspanetes do Presidente da República. Mas que é errado, é.