8 Junho 2015      15:30

Está aqui

CARLOS M. FAÍSCA

A cortiça já tem congresso internacional, que vai acontecer em Ponte-de-Sor, de 11 a 13 de Junho. Fomos conversar com o investigador Carlos Manuel Faísca, um dos organizadores, que nos explicou a relevância de um congresso da cortiça, um sector de fileira do Alentejo e porque acontece ele em Ponte-de-Sor.

Tribuna Alentejo: É a primeira edição deste congresso. O que motivou a sua organização? Porquê Ponte-de-Sor?

Carlos Faísca: A ideia de se realizar um congresso sobre o setor corticeiro nasceu em maio de 2013, num Congresso de História Contemporânea, realizado na Universidade de Évora, quando eu, o José Rangel Preciado e a Sónia Bombico percebemos que, apesar de trabalharmos temas relacionados com a exploração de cortiça, tínhamos uma grande lacuna de conhecimentos científicos sobre esta matéria fora das nossas áreas de trabalho – Arqueologia, a História e a Economia – sendo que mais tarde o Pedro Mourisco juntou-se ao grupo. Por outro lado, achámos que seria importante aliar o conhecimento académico àquele, por vezes de carácter mais empírico, que os agentes económicos que atuam no terreno – proprietários, industriais, etc. – possuem. Nesse sentido, decidimos que o congresso teria que sair fisicamente dos corredores da Universidades até aos locais em que a fileira da cortiça tem uma forte presença. Um desses locais é, sem dúvida, o concelho de Ponte de Sor, não só em termos históricos, mas também no presente, onde coexiste uma forte atividade económica agro-florestal, industrial e começam a desenvolver-se, ao nível do setor terciário, algumas atividades interessantes como o comércio e o turismo. Ora, a relação de proximidade que eu tinha com Ponte de Sor fez com que um pouco mais tarde a contactássemos apresentando esta ideia, que foi imediatamente apoiada pelo Presidente da Câmara Municipal, o Eng. Hugo Hilário, bem como por todo o executivo municipal.

Tribuna Alentejo: Uma iniciativa destas não se levanta sozinha. Quem está a apoiar o congresso?

Carlos Faísca: Em primeiro lugar, e ao nível autárquico, o Município de Ponte de Sor, a União de Freguesias de Ponte de Sor, Tramaga e Vale de Açor e a Junta de Freguesia de Galveias, enquanto a nível académico, destacam-se a Universidade de Évora, a Universidad de Extremadura e o Instituto Politécnico de Portalegre.

É de realçar o valioso patrocínio que nos concederam algumas indústrias locais, nomeadamente, a Sedacor (Grupo JPS) e o Grupo Amorim, o Banco BPI e os produtores de vinhos Alves Pimenta e Monte da Raposinha, sendo que estes últimos forneceram, a par com outro produtor que prefere o anonimato, o vinho com que iremos brindar cerca de 40 participantes que se inscreveram num almoço cujo menu é feito exclusivamente à base de produtos de cortiça. Esta refeição, por sua vez, será confecionada pelos alunos do curso profissional de técnico de restauração da Escola Secundária de Ponte de Sor, ou seja, uma outra entidade que se encontra envolvida. Aliás, na componente lúdica do congresso, contámos com a colaboração da IFCork e CSCork (desfile de moda), da Fundação das Casas de Fronteira e Alorna e da Retecork (exposições técnicas), do casal de fotógrafos Vera e Filipe Barroso (exposição de fotografia) e, novamente, da Escola Secundária de Ponte de Sor, agora através do curso vocacional de transformação de cortiça. Por último, as instituições de investigação dos membros da comissão científica, além das anteriormente citadas: o Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária, o ISEG/UL e o ICS/UL.

Tribuna Alentejo: Quais os objectivos que a organização se propõe atingir?

Carlos Faísca: São essencialmente dois os objetivos. Por um lado, o de promover interna e externamente aquela que é a principal atividade económica do concelho de Ponte de Sor e, quiçá, estimular a sua diversificação através, por exemplo, da criação de uma oferta turística relacionada com o montado de sobro e a fileira da cortiça. Por outro lado, a um plano académico, o de fomentar a interdisciplinaridade entre as diversas ciências que se ocupam do estudo destas temáticas, contribuindo, desta forma, para o aprofundamento do conhecimento humano sobre este ecossistema tão particular.

Tribuna Alentejo: Sendo um congresso internacional, qual o impacto que visa ter além fronteiras?

Carlos Faísca: Em linha com o que foi respondido na questão anterior, esperamos que alguns stakeholders estrangeiros, sobretudo espanhóis, mas também franceses e de outras paragens (temos dois comunicantes que, apesar da nacionalidade portuguesa, desenvolvem o seu trabalho no âmbito do montado de sobro e das aplicações de cortiça na Alemanha e no Canadá) associem Ponte de Sor à vitalidade de uma fileira com enormes potencialidades económicas e ecológicas. O total de comunicantes é de 52, dos quais 17 são estrangeiros. A este número temos que adicionar 25 pedidos de assistência que tivemos até ao dia de hoje.

Tribuna Alentejo: O que esperar deste sector no futuro? É possível crescer?

Carlos Faísca: Embora não seja a pessoa mais indicada para responder a esta questão – talvez, por exemplo, o Dr. Rui Ferreira da APCOR o seja –, os proveitos económicos da fileira da cortiça têm vindo a crescer, após uma viragem de milénio mais complicada, alavancados pelo aumento da produção de rolhas, pela diversificação produtiva e, muito paulatinamente, pelo turismo, que, aliás, tem maior expressão em Espanha do que em Portugal. Portanto, sim, é possível crescer e, na realidade, é esse o cenário mais plausível a médio prazo.

Tribuna Alentejo: As novas aplicações da cortiça têm surpreendido, esperam-se novidades apresentadas neste congresso?

Carlos Faísca: Sim, a exposição organizada pela Fundação das Casas de Fronteira e Alorna vai-nos trazer as mais recentes aplicações em cortiça com uma forte componente de inovação como, por exemplo, uma raquete de paddle ou um conjunto de mobiliário de origem nacional que foi premiado no concurso internacional 'A' Design Award & Competition, entre muitos outros artigos; para os descobrir, basta visitar o Centro de Artes e Cultura de Ponte de Sor nos próximos dias 11 a 13 de junho.

 

O programa completo do Congresso pode ser visto aqui.


"Carlos Manuel Faísca é Licenciado em História pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa e Mestre em Ciências da Informação e da Documentação, pela mesma instituição. Atualmente é doutorando na Universidad de Extremadura, desenvolvendo um projeto sobre o negócio corticeiro alentejano oitocentista intitulado «O negócio corticeiro no Alentejo: exploração florestal, indústria e política económica (1852-1914)».

Em simultâneo, é Técnico Superior de História e Biblioteconomia no Município de Ponte de Sor tendo, no passado, sido investigador de diversos projetos do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa e da Nova School of Business, o último dos quais intitulado Agricultura em Portugal: alimentação, desenvolvimento e sustentabilidade (1870-2010), sob a coordenação científica da Doutora Dulce Freire.

Conta com algumas publicações em periódicos científicos da área de Ciências da Informação – “O desbaste nas Bibliotecas de Ensino Superior portuguesas” publicado nas Páginas A&B – e da área de História – “O preço da crise: níveis de vida no Portugal seiscentista” publicado na Revista de História da Sociedade da Cultura, ou “Desigualdade de rendimento no Alentejo do Antigo Regime: Arraiolos, Avis e Portalegre (1690-1725)” a publicar brevemente na Análise Social, ou ainda a recensão da obra “Creating Wine: The emergence of a World Industry, 1840-1914” publicada na Business History."

Na imagem:  Ayers Cork Table, chair and luminaire de Albertina Oliveira, prémio da A'Design Award and Competition.