21 Junho 2021      11:26

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Mértola acolhe única colónia de peneireiros-das-torres no país

A única colónia de peneireiros-das-torres a nidificar num casco urbano está em Mértola. Classificada como espécie vulnerável, em tempos já foi muito abundante, mas entrou em declínio na segunda da metade do século passado. Atualmente a população destes pequenos falcões está estável, com um ligeiro aumento do número de casais presentes no país.

De acordo com o jornal Público, estas aves, adaptadas a nidificar em edifícios antigos, como castelos e as suas muralhas, sofreram com a reabilitação destes espaços, que os deixaram sem as fendas e buracos que usavam como casa. Para resolver o problema, foram colocadas caixas-ninho e construídas paredes de nidificação.

Numa das visitas aos ninhos, Carlos Carrapato, do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), encontra quatro ovos numa caixa-ninho. “Temos aqui uma postura de reposição. Esta espécie faz uma primeira postura no princípio de maio e [os ovos] eclodem no final. Por algum motivo, essa postura não funcionou e fizeram uma nova”, explica o biólogo.

Já Rita Alcazar, coordenadora da delegação de Castro Verde da Liga para a Proteção da Natureza (LPN), explica que há várias razões para que uma postura não funcione, a começar pela predação. A LPN acompanha a população de peneireiros-das-torres desde inícios do século XX, quando a associação desenvolveu ali um projeto Life dedicado à espécie.

Contudo, o desaparecimento de locais para nidificação não é o único obstáculo a esta espécie: em Mértola, muitos campos de cereais foram substituídos por matos ou florestas e, agora, os peneireiros-das-torres que ainda nidificam na vila têm de percorrer distâncias de pelo menos três quilómetros para encontrarem o alimento de que necessitam, para eles e para as crias.

Carlos Carrapato tem a função de anilhar as novas crias, o que permitirá, no futuro, graças aos códigos únicos de cada anilha, seja possível seguir o trajeto das aves, agregando mais informações sobre as que nasceram em Mértola.

O biólogo adianta ainda que “a colónia de Mértola foi a maior do país, com quase 80 casais. Agora temos 16. No ano passado eram 15 e este ano temos 16”. A monitorização da espécie por parte da LPN também aponta para algum otimismo: “a população tem continuado a aumentar ligeiramente. Temos mais ou menos 500 casais no país, com a ZPE [Zona de Proteção Especial] de Castro Verde a ter o maior número de colónias e casais, entre 70% a 75% do total. Embora o aumento não seja muito significativo, a espécie tem conseguido manter-se”, diz Rita Alcazar.

Outro dos obstáculos é o calor do Baixo Alentejo: as crias maiores e quase prontas a deixarem o ninho aproximam-se da entrada das caixas para se refrescarem e para tentarem ser as primeiras a ficar com o alimento trazido pelos progenitores. E pode acontecer que, na confusão competitiva que se gera, alguma seja inadvertidamente empurrada pelos irmãos para fora. Sem conseguirem ainda voar, algumas podem acabar no chão de Mértola.

Se tudo correr bem, hão de deixar as caixas-ninho e partir com os pais para os campos onde, durante algumas semanas, vão aprender a caçar e a alimentarem-se sozinhos. Depois, inicia-se a viagem até África, entre finais de julho e meados de fevereiro.

É nessa altura que o ICNF e a LPN aproveitam para limpar e restaurar as caixas-ninho, deixando-as prontas para o regresso, no final do Inverno do próximo ano. Nessa altura, pode ser que esteja já aprovado e a funcionar um projeto-piloto do ICNF que pretende diminuir as dificuldades de alimentação que a espécie enfrenta: a manutenção de um campo destinado a estas e outras aves estepárias.

“Nós vamos pagar a compra das sementes do cereal para um campo de 30 hectares, com a contrapartida de que não será ceifado. Já temos um manifesto de interesse assinado com o proprietário”, diz Ana Cristina Cardoso.

Além disso, noutros campos onde exista a nidificação de espécies como as abetardas, os proprietários vão receber também um pagamento para deixarem intacto um hectare em redor dos ninhos detetados. Apoiado por fundos europeus, a expetativa é que o projeto com o prazo de dois anos seja aprovado ainda em 2021.

 

Fotografia de olhares.com