Há poucos dias atrás fui contactado através de mail por um cidadão de Évora para falar sobre questões relacionadas com "Taxas de Justiça" e "Custas Processuais" pelo lesado/vítima, mas também sobre a forma como se processa o Requerimento de Proteção Jurídica – Pessoa Singular.
Este magnifico ato de cidadania merece ser relatado. Obviamente respeitando o anonimato da pessoa em questão.
Passo a descrever de uma forma muito sucinta em várias etapas a situação em concreto:
1) A sua casa foi assaltada, tendo-lhe sido furtados alguns bem pessoais. Para além do efeito terrível de insegurança e de invasão da privacidade, foram roubados bens muito importantes, como são exemplo o computador pessoal, máquina fotográfica e outros bens;
2) Seguidamente apresentou a queixa à polícia;
3) Algum tempo depois foi apanhado o respetivo assaltante;
4) O processo avançou através dos tribunais e como resultado o assaltante teve como pena ter que pagar 3.300€ à vitima e teve 20 meses de prisão (com pena suspensa). Este valor respeita o valor da indemnização que traduz o valor dos bens furtados. Não inclui dados não-patrimoniais que também os houve. Os 3300€ são uma estimativa baseada e comprovada, na sua maioria, pelas faturas dos bens furtados;
5) A partir daqui surgem os aspetos mais caricatos: O cidadão em questão (vítima do assalto) recorre aos serviços judiciais para lhe serem ressarcidas as verbas a que tinha direito;
6) A pessoa que estava de serviço informa-o que dificilmente lhe seriam restituídas as verbas, isto porque o assaltante não tinha nada em seu nome;
7) Para agravar a situação o cidadão em questão (vítima do assalto) foi-lhe apresentada a conta de 204€ para pagar as custas judiciais;
8) Um pormenor: a vítima em questão está temporariamente desempregado e não tem condições para pagar as custas judiciais. No entanto, caso não pague as verbas serão agravadas e poderão ficar em causa alguns bens que possui (ex: carro);
9) Por impossibilidade de o fazer, atendendo à sua condição de desempregado, teve o referido cidadão (vítima do assalto) de se socorrer (mesmo contra vontade) de um familiar para pagar a verba em questão. Caso não o tivesse feito, passaria a “agressor” do Estado “Democrático” e veria "a divida" crescer exponencialmente num curto espaço de tempo;
10) Num gesto de cidadania e de justiça, o cidadão em questão (vítima do assalto) recorre através dos meios possíveis para que esta situação seja corrigida (ex: Tribunal de Justiça, deputados, etc). Note-se que ele sabe que as verbas em questão dificilmente serão recuperadas;
11) Com o objetivo de recorrer contra o Estado sobre a matéria em apreço, solicitou Proteção Jurídica através da Segurança Social. Processo que se revelou um pesadelo burocrático e de doentio escrutino e devassa da vida pessoal e patrimonial ;
12) Apesar ter sido sempre bem recebido em todos os serviços, as soluções nunca surgiram.
Foi nesse sentido que nos conhecemos.
Moral da história: toda esta legislação e mecanismos complexos não facilitam, e até desencorajam e dificultam o "acesso à Justiça" pelos mais desfavorecidos e necessitados.
Tal como me foi referido, o peso burocrático que impõe, faz com que os Cidadãos desistam de que lhes seja dada a oportunidade para serem representadas condignamente nos Tribunais. Dificulta, desencoraja e impede, o "acesso à Justiça" pelas pessoas que não têm meios próprios para pagar a um Advogado.
Procurei informar-me para saber como é que estes processos funcionam e se poderia (através dos meus colegas da área da justiça) tomar alguma iniciativa na Assembleia da República. Fiquei a saber que no dia em que o cidadão em questão apresentou a respetiva queixa, deveria ter pedido o respetivo apoio judicial. Tinha que ser naquele período. Não o fez, perdeu a possibilidade de apoio. O problema é que a maioria dos cidadãos não têm essa perceção. É essa a minha convicção.
Não o fazendo naquele período, já não o podem fazer.
Citando alguém muito conhecido: Não havia necessidade!
Mas, infelizmente, o nosso sistema de justiça tem destas coisas, pouco amigáveis e nada próximas dos cidadãos.
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