26 Novembro 2024      19:43

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“Um povo que canta não pode morrer.” - 10 anos de Património Mundial

Esta frase é de Michel Giacometti - musicólogo e etnólogo a quem o Alentejo muito deve - expressa bem o sentimento e o orgulho que temos no nosso cantar e na maneira como se sente. Um orgulho que cresce ainda mais hoje, 10 anos depois da elevação do Cante a Património Imaterial da Humanidade da UNESCO.

Por todo o nosso amor ao Alentejo, teria sido contranatura se nós, Tribuna Alentejo, enquanto órgão de comunicação social, não tivéssemos feito o que estivesse ao nosso alcance para apoiar a candidatura do Cante Alentejano.

Desde o final do verão de 2014, o TA tinha iniciado uma série de postais com modas alentejanas que saiam ao sábado; fizemos dezenas de artigos e notícias sobre o tema e foi com esperança que, poucas semanas antes do dia decisório, noticiámos as palavras do então presidente do Turismo do Alentejo e Ribatejo, Ceia da Silva, que referia que “a pré-avaliação da candidatura do Cante foi considerada exemplar, trata-se ainda do parecer técnico, mas que muito deve orgulhar Portugal e o Alentejo”

Esta batalha pela distinção do Cante tinha sido iniciada anos antes, em 2012, mas o Ministro dos Negócios Estrangeiros, à época Paulo Portas, recusou a sua apresentação em detrimento da dieta mediterrânica. Considerou que a candidatura do Cante não reunia todas as condições, tendo decidido apresentar a candidatura só em 2013. Assim, de 24 a 28 de novembro de 2014, todos os alentejanos esperavam notícias de Paris, queríamos ouvir: “o Cante é Património Mundial!” E foi o que aconteceu a 27 de novembro desse ano: o Cante de todos nós, a expressão de todo um povo era, finalmente, Património Cultural Imaterial da Humanidade da UNESCO.

As “modas alentejanas” são sobre a vida de outros tempos; contam a história do povo que não vem nos manuais. Estas modas têm a sua inspiração no trabalho, no amor, na contemplação e na nostalgia desta vasta planície e, embora não se identifique com exatidão a sua origem, distinguem-se de outros cânticos e manifestações culturais semelhantes pela “lentidão; a moderação das acentuações, os melismas e até certas ‘anomalias’ harmónicas” (referiu Santos, 2010, em Memoriamedia), refletindo um pouco o modo de estar próprio das nossas gentes.

Disse Miguel Torga que “Mais do que fruir a direta emoção dum lúdico passeio, quem percorre o Alentejo tem de meditar. E ir explicando aos olhos a significação profunda do que vê.” Foi o que tentou mostrar Sérgio Tréfaut no seu filme “Alentejo, Alentejo”, o documentário que acompanhou a candidatura do Cante em 2014, e que tão bem retrata o Cante e o Alentejo.

O Alentejo é hoje um destino turístico e cultural de eleição, quer seja pelo campo, pelo sol, quer tenha o mar ou a terra em pano de fundo. Não faltam fatores distintivos de qualidade eleição: o vinho, o azeite, o pão, o queijo, os enchidos, a gastronomia e o imaterial como a hospitalidade, a solidariedade e, em todos eles, o Cante e no Cante também todos eles.  

O Cante consubstancia em poucas palavras e versos simples grande parte da história e alma do Alentejo. Onde há um alentejano, há Cante.

Desde a sua candidatura, em 2013, o Cante reconquistou a sua importância no coração dos alentejanos e é agora presença assídua em eventos e festivais de música. Os grupos corais desenvolveram-se e outros nasceram; jovens aprenderam e seguiram a tradição.

O Tribuna orgulha-se de ter feito o que pode para promovê-lo e ao longo desta quimera. Na antiga Taberna do Fané, atual casa de um dos um dos mais míticos grupos corais alentejanos, os “Camponeses de Pias”, e onde fomos tão bem recebidos pelo grupo e pela Câmara Municipal de Serpa, um cartaz de 1983 dizia “A cultura é um direito do povo.” O Cante é nosso direito, pois ele contém a nossa alma e as nossas raízes! Viva o Cante! Viva o Alentejo!

 

Imagem de unescoportugal.mne.gov. pt