2 Janeiro 2021      14:32

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As palavras

Em início de ano e em jeito de conclusão do ano que terminou, interrompendo as falas dos animais e as longas histórias a que já me acostumaram e vos acostumaram, achei proveitoso fazer um momento de reflexão. E essa reflexão passa pelas ideias, pelos sentimentos, pelas sensações, pelas imagens e, concretizando-se, pelas palavras que escrevo e sempre partilho convosco. Há quase seis anos que partilho palavras semanalmente. São neste momento 298 artigos... 298 semanas com ideias novas, com temas tão diferentes quanto semelhantes, tão complexos quanto singelos, tão inovadores como banais.

Houve, há e haverá em cada momento, uma história nova, uma personagem que eu não conhecia e, passando a conhecer, vos apresentei. Aquilo que espero é que delas se possam recordar, futuramente.

Voltemos às palavras e ao nosso argumento. Tantas vezes se fala nelas. Tantas vezes as usamos, umas vezes de forma erudita e epistemológica, outras hermenêutica, por vezes derrapamos no prosaico, na verborreia e no discurso errático e tudo, sempre, nas e através das palavras.

Assumir que a comunicação verbal do ser humano é fulcral e fundamental não implicará configurações académicas. É uma verdade empírica, legível, identificável através dos sentidos e, essa só é possível pelas lavaras e pelo uso que delas fazemos, ou pela percepção que delas temos.

As palavras são poderosas. Emitidas, são tantas vezes mais mortíferas que mísseis ou mais importantes para o ego do que a atribuição de um prémio ao nível de um Nobel. As palavras são simples. Tocam-nós nos mais elementares e simples sentidos do nosso corpo, da nossa existência. Há nelas o do de, mesmo sendo difíceis, serem perceptíveis aos que menos dominam todo o léxico.

As palavras são boas. São as palavras que nos confortam quando nos sentimos em baixo e sem energias. São as palavras que nos erguem quando os nossos sentidos abandonam a coragem de fazer frente ao que pensamos impossível. E são elas que transmitem a compaixão, o amor, a amizade e a caridade.

Porém, as palavras podem ser más. São elas que destroem o caráter. Exaladas por sentimentos de natureza maliciosa, demente ou até puramente má, são capazes de infligir dores tão profundas e tão irreparáveis que tantas vezes podem decidir a vida e a morte. As palavras são vida e são morte. As próprias palavras definem e concretizam o que é a vida e a morte.

As palavras são conhecimento. Só por elas sabemos mais, só por elas damos mais a conhecer a outros que as usam da mesma forma que nós.

As palavras por vezes não se compreendem, tantos momentos em lugares diferentes não se entendem ou, surpreendentemente, têm relações de causalidade e familiaridade e relacionam-se. As palavras são o braço, os ramos e as folhas das línguas. E é pelas línguas que nos entendemos. Porém, só pelas palavras nos podemos entender e desentender.

A cada palavra, correspondem letras. A cada língua correspondem palavras e frases e sentidos e significados e significantes.

Somos tão importantes para as palavras, como as palavras para nós. A diferença suprema é que só existimos, nos relacionamos, nos afirmamos e somos pelas palavras. As palavras, essas, continuarão a existir sem nós, e de nós serão a memória, seja ela registada em pedra, em livros, em tantos outros formatos que inventamos para as reproduzir.

E, em qualquer tempo, lembremo-nos de que, no início era o Verbo. No fim será o Verbo, talvez com uns adjectivos, advérbios, substantivos e até preposições à mistura. Este foi o nosso artigo. Bom ano!