4 Novembro 2020      11:33

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Paisagem de montado em Portugal perde 5 mil hectares por ano

Portugal, e sobretudo o Alentejo, tem a maior área de montado de sobro e de azinho do mundo, fazendo um total de cerca de um milhão e duzentos mil hectares, ou seja, mais de 20% de toda a floresta nacional. No entanto, os números mostram que desde 1990 que Portugal perde, em média, cinco mil hectares desta área por ano.

O país tem um milhão e duzentos mil hectares de montado (de sobro e de azinho), com várias densidades, “mas vamos perdendo estes hectares anualmente, não por haver um corte ou por decisão de cortar as árvores, mas simplesmente porque as árvores vão morrendo e não vão sendo repostas”, afirma Teresa Pinto Correia, investigadora e professora da Universidade de Évora (UÉ), à TSF.

Já Margarida Santos Reis, professora na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, garante que este sistema agroflorestal é de uso múltiplo, moldado pelo homem. Paisagem dominada por árvores como o sobreiro e a azinheira, “espécies que tinham porte essencialmente arbustivo, mas que devido à intervenção do homem e atividades agrícolas, começou a ser selecionado para crescer e fazer sombra, e criou uma floresta que é utilizada de múltiplas formas”. Por exemplo, o sobreiro produz cortiça e a azinheira produz bolota, essenciais para a produção de porcos, uma atividade também muito associada ao Alentejo.

Teresa Pinto Correia, da UÉ, diz ainda que existe um livro verde dos montados, criado em 2013, que permite olhar para o montado por outras perspetivas que não apenas a económica. O livro tem como objetivo dar a conhecer o sistema, mas também as suas ameaças. “É um sistema onde há árvores, a componente de pastoreio e, em algumas vezes, a componente agrícola”, explica a investigadora, sublinhando que a componente de pastoreio e pecuária têm um peso fundamental. “Importa gerir o equilíbrio” de tudo isto, pois “não podemos esperar que todos os montados sejam só florestais”.

O país produz mais de 50% da cortiça mundial e exporta mais de 900 milhões de euros em materiais ligados à cortiça por ano. No entanto, e apesar de as exportações aumentarem de ano para ano, continua a ver-se um recuo da população de sobreiros em todo o território.

De acordo com esta professora, é necessário ajudar os proprietários a perceberem como pode existir um equilíbrio entre a preservação e a sua rentabilidade económica. Para isso, sugere “criar modelos de negócio igualmente rentáveis, mas que consigam manter este equilíbrio necessário, por exemplo com as espécies de gado bovino mais sustentáveis, como as raças autóctones”.

Uma das principais ameaças ao montado português reside nas alterações climáticas. Cristina Máguas, coordenadora do Centro de Investigação de Ecologia, Evolução e Alterações Climáticas e professora na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, refere que “no montado de sobro, uma das falhas que tem acontecido é pensar-se que ele é muito resistente e adaptado à seca. Ele está verdadeiramente adaptado à seca, mas apenas até um certo limite”. Contudo, associado às alterações climáticas “temos uma gestão e uma exploração que nem sempre foi conduzida da melhor forma”.

A professora acrescenta que, em muitos casos, é preciso também perceber a questão do solo e dos micro-organismos que nele existem. “Uma exploração exagerada em termos pecuários, a utilização de gado bovino em sistemas intensivos faz com que o solo deixe de ter a capacidade de responder à seca, que sabemos que existe num clima mediterrâneo”, explica.

O montado é um sistema único a nível mundial, que importa preservar, do ponto de vista económico, cultural e ambiental. Por isso, foi tema do terceiro Terra a Terra Especial, Lisboa - Capital Verde Europeia.

 

Fotografia de olhares.com