23 Junho 2018      16:02

Está aqui

Paço a Passo

Andava tudo num virote. A mulher, o marido, os filhos, os primos, os empregados e as empregadas, o cão, o gato, as galinhas e o pato. Porquê ninguém sabia bem. Eu sei, mas não conto. Enquadremos o texto que aqui se sugere a leitura. A família morava num paço, que é uma casa grande, enorme neste caso. O Paço da família Passos era uma distinta moradia. Andava tudo numa azáfama. Era dia de festa. O seguinte. Aquele era da preparação. A mulher, o marido, os filhos, os primos, os empregados e as empregadas, o cão, o gato, as galinhas e o pato.

A mulher, Senhora Passos, acelerava o passo no paço. A ocasião do dia seguinte era solene. Celebravam, pela primeira vez, o almoço dos primos e tios e filhos e netos. Enfim, toda a família viria para o grande evento no Paço dos Passos. A porta principal, de madeira maciça, pesadíssima, abrir-se-ia naquele dia pela primeira vez no ano. Esta coisa de preparar eventos é uma grande trabalheira, pensava a mulher. A senhora Passos, devota do Senhor dos Passos, informação relevante para entendermos toda a envolvência e todos os momentos da comissão preparatória. Desta, como já aludimos acima, faziam parte, a mulher, o marido, os filhos, os primos, os empregados, as empregadas, o cão, o gato, as galinhas e o pato.

Azáfama. Virote. Tudo a reboque. Ordem para cá, ordem para lá, pedido mais suave, riso mais agressivo. Os nervos à flor da pele. Era necessário pôr as mesas, os acepipes e os aperitivos, as bebidas no frio, cortar a fruta para a sangria e limpar o pátio do paço. Que grande festança seria. Faltava chegarem os músicos. Ainda iam demorar, vinham de carroça pois gostavam de viver à maneira antiga. Não tinham relação com os Amish mas estavam lá perto. Eram liberais e almas livres. Viajavam de carroça e andavam sempre em grupo. A mulher estava preocupada. E o marido preocupado estava. Os empregados, esses estavam só ocupados.

Um dia. Faltava só um dia para a grande festa. Os filhos estavam todos contentes. Aquilo era um acontecimento. Festa no paço. As galinhas e os frangos estavam já depenados e aguardavam as brasas. Os leitões pensavam em ir para o forno daí a umas horas e todos estavam nervosos. Todos, os donos da casa, entenda-se. Lá andavam. Poderia descrever o paço, mas ocuparia muito tempo e o que interessa mesmo é a festa. Demos então um salto no tempo.

Era o dia. O grande dia dos Passos no paço. Num canto, a imagem do Senhor dos Passos, no outro canto, fotografias de todos os membros da família, tirada no ano anterior. Uns ainda lá estavam, membros tinham já desparecido. Não muitos mas ainda se notava. O que era certo é que todos estavam um ano mais velhos. Isto acontecia sempre a 23 de junho, um dia antes de São João. A senhora Passos tinha feito já tantos nesse dia, contava-os na aplicação do telemóvel e sabia-lhe bem, mas mal podia esperar que terminasse tudo. Azáfama. Tarefas por cumprir. Virote.

Começavam a chegar os convidados e lá se iam sentando. Os frangos e as galinhas ocupavam os lugares na grelha. Não faltavam sardinhas e os leitões estavam já assados. Dispunham-se em cima da mesa. A sangria, fresquinha, estava em vários jarros ao longo do banquete. Os comensais sentavam-se e com ar de fome, crescia-lhes água na boca. O paço, passo a passo, ia ficando composto. A festa continuava. Decorria a bom termo. Não faltava nada. Risos, alegria. Toda a gente comia. Banquete. Festim. Paço dos Passos era o lugar para estar e foi nesse momento que começou a música. A banda dos irreverentes começou a tocar. A música fazia todos vibrarem e dançarem. Parecia que este ano tinha sido melhor ainda do que no ano passado. E no fim, os convidados começaram a ir e toda a gente estava de rastos com a azáfama, com o movimento. A missão tinha sido cumprida e a família estava contente. Senhora e senhor Passos estavam orgulhosos.

Todos estavam felizes, especialmente o pato, que acompanhou tudo e livrou-se das brasas.