25 Fevereiro 2020      11:16

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O génio das mulheres em Arraiolos no Festival Terras Sem Sombra

O Festival Terras sem Sombra em Arraiolos celebra a arte e a ciência pela mão das mulheres entre 29 de fevereiro e 1 de março.

O programa musical propõe um diálogo entre a flautista checa Monika Streitová e a pianista portuguesa Ana Telles. A acção de Património Cultural homenageia a arte tapeteira e o saber imemorial das artesãs arraiolenses e, no âmbito da Salvaguarda da Biodiversidade, resgata-se a bolota como alimento do futuro, pondo-a em relação com o montado.

A programação para o fim-de-semana de 29 de Fevereiro e 1 de Março, naquela vila do Alentejo central, destaca a arte no feminino, seja na grande música ou no saber ancestral das tapeteiras. Também na iniciativa de Salvaguarda do Património – dedicada à bolota – as mulheres assumem o protagonismo, seja na ciência ou na vida empresarial. No que toca à Música, sábado, às 21h30, na igreja do convento de Nossa Senhora da Assunção, vulgo Lóios (Pousada), a arte das musas faz-se ouvir no diálogo musical entre a flauta da checa Monika Streitová e o piano da portuguesa Ana Telles.

O ponto de encontro para sábado à tarde (15h00) é no edifício do Centro Interpretativo do Tapete de Arraiolos, um dos mais antigos e históricos da vila, erigido num local onde se descobriu um complexo arqueológico com mais de 95 fossas, onde funcionaram tinturarias associadas ao tingimento da lã. A proposta da acção de Património é uma viagem ao Tapete de Arraiolos orientada pelo historiador Rui Miguel Lobo e pelo historiador de arte – e também director-geral do Terra sem Sombra – José António Falcão.

Momento para percorrer oficinas de fabrico de tapetes e entabular conversa com algumas das guardiãs deste labor, as bordadeiras. A actividade terá também uma vertente direccionada para o público infantil, com uma oficina criativa adaptada às crianças que se familiarizarão com o fabrico dos tapetes, os desenhos, as cores, os materiais.

A origem do Tapete de Arraiolos não é clara. Talvez esteja ligada à continuidade, no Alentejo, de uma tradição própria das comunidades muçulmanas, mas faltam documentos que o explicitem de modo peremptório. A referência mais antiga aos tapetes de Arraiolos data de 1598 e os investigadores acreditam que a origem esteja ligada aos tapeteiros muçulmanos de Lisboa, expulsos por D. Manuel em 1496. No coração do Alentejo, esta tradição atingiu o apogeu durante os séculos XVII e XVIII, quando, sob o impulso do Barroco, uniu o imaginário coevo, filtrado pela criatividade TSS 09_Press-release_Arraiolos 3 da arte vernácula, à influência dos tapetes importados do Oriente, em particular da Turquia e da Pérsia. Técnicas, materiais, objectos e saber-fazer constituem, em Arraiolos, um legado transmitido de mães para filhas.

O programa do fim-de-semana Terras sem Sombra termina com a habitual acção de salvaguarda da biodiversidade (1 de Março, 9h30). Desta feita, o tema é a bolota e as suas virtudes numa apresentação feita no Moinho de Pisões, em Aldeia da Serra, por três especialistas: José Mira Potes (engenheiro zootécnico), Teresa Rita Barrocas (empresária) e Ana Fonseca (investigadora). A bolota – fruto da azinheira, do sobreiro e do carvalho – tem um lugar fundamental na criação do gado, sobretudo o porcino, conferindo grande qualidade à sua carne. Mas as variedades mais doces assumiram também importância na alimentação humana. Os antigos povos europeus consumiam-na na íntegra, moíam-na para obter farinha empregue na confecção de pão ou maceravam-na em água, de que resultava uma bebida fermentada, muito nutritiva, comparável à cerveja.

Na gastronomia tradicional, sobrevivem reminiscências desses usos, sendo a bolota empregue como complemento ou petisco. As populações rurais consomem-nas cruas ou assadas. Também era usual venderem-se, nas feiras, enfiadas de bolotas bem secas (aveladas) ou torradas. Noutros tempos, extraiu-se também óleo da bolota. Agora, em tempos em que uma nutrição mais natural ganha destaque, assiste-se à redescoberta de tão nobre, mas esquecido, fruto, cujo paladar é, de certo modo, único: sem glúten, com alto poder antioxidante, uma gordura semelhante à do azeite e compostos assaz úteis à saúde. O “pão dos pobres” ganha protagonismo como um alimento do futuro, o que constitui também um sinal de esperança para a recuperação do montando, em particular o de azinho, já que as bolotas da azinheira são as mais doces.

Em 2020, a 16.ª temporada do Terras sem Sombra decorrerá entre Janeiro e Julho, mantendo a sua programação centrada na música clássica, património e biodiversidade. O Festival vai percorrer os concelhos de Vidigueira, Barrancos, Mértola, Arraiolos, Viana do Alentejo, Beja, Ferreira do Alentejo, Castelo de Vide, Sines, Alter do Chão, Campo Maior, Santiago do Cacém e Odemira.

 

Imagem de capa de fromportugal.org