9 Junho 2016      12:31

Está aqui

O ALENTEJO É O CENTRO DO MEU UNIVERSO

Considerado como uma abordagem contemporânea ao Cante Alentejano, numa fómula musical que junta a composição tradicional com os novos sons da World Music, o projeto musical Monda concentra quase toda a sua energia e expectativa. Nascido no Alentejo assim como todos os músicos envolvidos e que são mais dois, com Pedro Zagalo e o Herlander Medinas, lançou recentemente o primeiro álbum deste novo projecto, que conta com as participações especiais de Katia Guerreiro, Rui Veloso, Tiago Oliveira e do Grupo de Cantadores de Portel.

Falamos de Jorge Roque, com quem o Tribuna Alentejo teve a oportunidade de conversar e saber mais do que vai na alma deste músico alentejano. Texto por João M. Pereirinha.

Tribuna Alentejo: Com vários romances anteriores, no Design, na Arquitetura, a Música foi “uma minúscula fração de faísca” incontrolável, de amor à primeira vista (como diz a canção), ou precisou de mais encontros? O que há na música que não pode calar?

Jorge Roque: Ainda hoje o Design e a Arquitectura fazem parte dos meus interesses mais comuns. Costumo dizer que são as minhas artes de paixão. Mas a música foi sempre o meu grande amor. Costumo dizer que ela é a banda sonora da minha vida.

 

Tribuna Alentejo: Porquê o Fado de Coimbra, e depois de Lisboa, desde criança?

Jorge Roque: Aconteceu. Na altura o fado não estava na moda, mas eu sempre cresci a ouvir fado, tal como o cante nos locais habituais em Portel. Amália, Tony de Matos, Francisco José, Carlos do Carmo ou Luis Gois, fizeram e fazem parte da minha discografia ao longo destes anos.

Ainda hoje, cada vez que posso e me deixam, canto o fado.

Tribuna Alentejo: Para alguém com uma ligação profunda à música, o que significou ter nascido e crescido no Alentejo?

Jorge Roque: O Alentejo é hoje visto com outros olhos, ou se quisermos, com outro modo de olhar, o que nem sempre aconteceu. Não gosto muito de pensar, como alguns teimam em dizer, que o Alentejo está na moda. Uma região com tanto património, tanto saber e tanta cultura popular não pode estar ou deixar de estar na moda. O Alentejo apenas está a receber aquilo que sempre foi seu por mérito. O prémio da autenticidade. É esse o segredo e espero que nunca mude, pois esse é orgulho de crescer numa região tão genuína e com tanta pureza, que nos orgulha e acompanha durante toda uma vida.

 

Tribuna Alentejo: O que é preciso para interpretar e sentir o Cante Alentejano? Como é que os Cantares influenciaram a vida e o cantar do Jorge?

Jorge Roque: Não é fadista quem quer, mas quem nasce. A mesma frase se pode aplicar ao cante na minha maneira de ver. Contudo, as minhas influências não são exclusivas do cante. É preciso talento, muito trabalho e sobretudo muita capacidade para ouvir todos os grandes interpretes. Estar em constante aprendizagem e procura de novos sons. Aprender com todos não imitando ninguém.

Tribuna Alentejo: Visto lá de fora, do Porto, de Itália e de Boston, o Alentejo e Portugal têm um ritmo, ou um tom, diferentes do resto do mundo e da vida?

Jorge Roque: O Alentejo é o centro do meu universo e nesse sentido há sempre um retorno a casa, mesmo quando se está muito tempo fora. Isso, tanto se pode aplicar à minha enquanto músico ou pessoal. E muitas vezes esse retorno é feito pela forma de estarmos na vida e pela cultura que trazemos connosco e não tanto com o local físico onde nos encontramos.

 

Tribuna Alentejo: Vencer a Operação Triunfo significou o quê? Em que medida é que foi um ponto alto, ou um ponto de viragem, que veio a mudar tudo daí em diante?

Jorge Roque: A Operação Triunfo foi mais um dos pontos que fez parte do meu percurso enquanto músico.

Não me trouxe nada de mais, para além de uma visibilidade ténue e efémera. O que tenho na música devo-o ao meu trabalho e à minha dedicação enquanto pessoa que vê na criatividade o seu modo de vida.

Tribuna Alentejo: Há algo que tenha mudado, devido ao estrelado, ou essa foi apenas uma etapa de um caminho repleto de influências?

Jorge Roque: Ainda hoje ouço muita música e opto sempre por aquela que considero ser a melhor. Esse é a única maneira de nos tornarmos melhores enquanto músico ou intérprete. Quanto ao estrelato, penso que não existe em Portugal. Não temos dimensão artística para tal.

 

Tribuna Alentejo: Quanto das origens, do refúgio a que chamamos memórias e experiências, e de que forma, podemos encontrar no trabalho compulsivo, de um alentejano apaixonado pela composição musical?

Jorge Roque: O teu trabalho enquanto autor, enquanto criativo, não depende apenas das tuas origens ou da região onde vives. As tuas experiências de vida, de educação, de aprendizagem natural, essas sim, tornam-te mais desperto para determinadas situações que conduzem à criatividade.

É em relação a esta que me considero um compulsivo. Não consigo estar parado sem pensar em criar algo de novo.

Tribuna Alentejo: A espontaneidade com que surgiu o projeto Monda (Jorge Roque, Pedro Zagalo, Herlander Medinas), é fruto desse trabalho?

Jorge Roque: Há um ano e meio, eu fiz um arranjo para um tema popular do cancioneiro alentejano que acabou por ser a alavanca de ideias para este projecto. Mostrei o tema ao Pedro e ao Herlander e criámos então um arranjo para “O Mocho”, que contém um texto muito peculiar e bizzaro.

Percebemos que, quase ingenuamente, tínhamos criado uma nova vertente no cante.

Talvez por termos culturas e campos musicais que nos permitiam fazer aquela abordagem que resulta numa aproximação clara à world music. O assemble de instrumentos acústicos e as sonoridades electrónicas, são fundamentais para as novas composições que, para nós, assentam como uma luva nas modas que desde sempre estiveram no nosso imaginário.

Tribuna Alentejo: Entre a fábula, da memória, e vivência que fazem a cultura alentejana, onde começa um e termina o outro?

Jorge Roque: Eu penso que não se distinguem. Estão constantemente na nossa relação com os outros, com o mundo e com a música.

 

Tribuna Alentejo: Que identidade podemos esperar e encontrar do Jorge nos trabalhos seus trabalhos futuros, e dos Monda?

Jorge Roque: Exactamentea nossa identidade. O nosso cunho, sem descurar a primazia dos textos e das melodias obviamente, pois esses , mais do que a música, as vozes ou os seus intérpretes, representam o verdadeiro património imaterial da humanidade.

 

Ligue-se ao projecto aqui.

Imagem de capa daqui.