31 Dezembro 2019      11:26

Está aqui

Mais um que já foi, mais um que vem

Chegamos a mais um final de ano. Pode parecer impressão minha, mas com o passar deles, dos anos, parece-me que se sucedem mais rápidos, como o passar dos meses, das semanas, dos dias, das horas…

Fico sempre com a sensação de querer ter feito mais qualquer coisa, de querer ter aproveitado melhor) ainda melhor) cada minuto de 2019.

Com o final do ano chegam também as previsões para o novo ano, as estatísticas e os números do ano que passa e há vários assuntos que gostaria de tocar neste último editorial de 2019.

Tornou-se, do nosso ponto de vista, inevitável falar deste número: 170.000. Este é o número de violações graves contra menores, de ataques contra crianças em zonas de conflito, desde 2010, dados da UNICEF.

Assassínio e mutilação, recrutamento e utilização por forças e grupos armados, violência sexual, ataques contra escolas ou hospitais, rapto e negação do acesso humanitário às crianças são os crimes em questão. As crianças não só continuam a pagar pelas guerras de que não são culpadas, como este número triplicou desde 2010, cifrando-se agora em cerca de 45 violações graves por dia.

A UNICEF fez saber, em comunicado, que desde 1989, aquando da Convenção sobre os Direitos da Criança, nunca houve tantos países em conflito. Responsáveis da organização dizem mesmo que, por cada caso que chega à comunicação social, há muitos outros que não são sequer reportados.

Só em 2018, morreram ou foram mutiladas mais de 12 mil crianças; foram registadas mais de 24 mil violações graves contra crianças, o dobro de 2010. Em 2019 não houve melhorias e nos primeiros seis meses registaram-se mais de 10 mil violações contra crianças, embora a ONU assuma que o número possa ser muito superior.

Síria, Iémen, Iraque, Afeganistão, Burkina Faso e leste da Ucrânia são os locais que mais registos têm apresentado, a UNICEF relata várias situações que ao longo dos 12 meses de 2019 afetaram violentamente as crianças e que fizeram vítimas entre os mais jovens.

Nem será necessário falar nos milhares que vivem nas centenas de campos de refugiados ao longo do mundo, e sim, também na Europa, ou será?

Quer neste problema, quer noutros, a imprensa tem um papel fulcral.

Em Portugal, a discussão sobre o futuro da imprensa foi bastante debatido este ano. Quer seja pela mais recente construção de um suposto monopólio na comunicação, quer seja pela assunção, mais ou menos assumida de linhas editoriais politizadas – algo natural nos países anglo-saxónicos. Creio que, de modo geral, a imprensa nacional não tem sabido dar resposta ao verdadeiro desafio da década: mostrar a necessidade de uma imprensa livre, uma imprensa que se saiba distinguir das “fake-news” e dos populismos encomendados! Ficou presa à questão da subsistência, da sobrevivência económica, ao bom modo “tuga”, sem perceberem as direções editoriais e as empresas que uma coisa leva à outra. Em consequência, centenas de jornalistas foram despedidos de jornais e rádios nacionais.

Em todo o mundo, este ano, foram mortos 49 jornalistas, alguns deliberadamente assassinados; 389 estão presos (sobretudo na China, Egipto e Arábia Saudita) e 57 são reféns, sem contar as inúmeras agressões, números revelados no relatório da organização não governamental Repórteres sem Fronteiras (RSF). Ainda assim, no que respeita ao número de mortes há uma redução de quase metade, face à média dos 20 anos anteriores.

E apesar de muitas mortes se terem verificado em países em guerra, sobretudo no Médio Oriente, também a América Latina aparece agora como um ponto negro; só no México foram registados 10 óbitos.

A imprensa e o jornalismo são o garante da Democracia, de um mundo mais consciente, justo, solidário e fraterno. O jornalismo promove a igualdade de acesso ao conhecimento, à compreensão do mundo que nos rodeia. Um jornalismo sério dá conta desse mundo; um jornalismo dependente ou exclusivamente preocupado com os lucros, dá conta do mundo que lhe convém e, como disse o Marquês de Maricá, “Num povo ignorante a opinião pública representa a sua própria ignorância.”

Para confirmar tal facto, basta ler alguns dos comentários de alguns leitores em algumas notícias e opiniões em qualquer jornal nacional, o nosso incluído. O não respeitar da opinião contrária, a ofensa gratuita, o opinar infundado são mostras de uma sociedade em declínio de valores e a imprensa tem aqui a responsabilidade de, se não inverter o ciclo, não o promover.

Estas brechas da sociedade democrática são facilmente aproveitadas pelos Trumps e os Bolsonaros deste mundo; eles andam aí à espreita, e não são de imitação como Chaplin que imitou Hitler; têm tido o palco necessário à promoção da ignorância, da desinformação, de um fascismo encapuçado de justiça social.

Não caia a imprensa portuguesa nestes truques, pois corre o risco de fazer cair o próprio país. A Liberdade não é coisa de que se possa abdicar ou colocar em risco.

Fique com este trecho maravilhoso do filme “O Grande Ditator”, do referido Chaplin, e use-o para iniciar o novo ano com maior consciência social, com mais fervor na luta pela Liberdade, pela Igualdade e por um mundo mais Fraterno.

De toda a equipa do Tribuna Alentejo, obrigado por estar desse lado em 2019.

Em 2020, continuaremos juntos! Votos de um bom ano!

 

 

Imagem de moviemezzanine.com