16 Agosto 2020      12:02

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Lição ao meu eu heurístico e existencialista

Sacrifico o meu coro ao afirmar que já não és a mesma menina escritora, até porque já foste capaz de admitir que a fragilidade humana está incutida no nosso sangue, e não estamos aptos a suportar todos os choques desta vida que atingem o (a) nosso (nossa) corpo (alma). A vida mata; o amor mata, e deixa-me que te diga que não voltaria a deixar morrer o meu interior outra vez; só para poder sentir a intensidade dessa tua vida repleta de benevolência, dessa tua dor. Mas sabes que a felicidade corrói a inevitabilidade da humanidade e, consequentemente, também a minha pele. Talvez Vergílio Ferreira tenha tido uma razão dolorosa ao encarnar a personagem de Alberto Soares, também eu me sinto uma advogada da corrente do existencialismo. Também eu um ser à descoberta da fase final das minhas coisas e da minha própria verdade imperfeita, mas que não sou nada mais do que alguém impotente perante a inacessibilidade daquilo que procura

Desacredita-te da ideia de que aqui será melhor do que a fase onde te encontras; onde todos notam o teu aspeto abstrato, o olhar fundo e a alma caída sabe-se lá onde. Porque eu denoto o teu aspeto até hoje; tão claro e tão único… A verdade é que eu sempre soube que a inocência chegaria a ser cúmplice da maldade; eu apenas não queria aceitar a parte da conexão em que se torna estranguladora. Nem tu. Continuamos com os problemas metafísicos para resolver – que fado.

No final de tudo, somos só tu e eu (sou só eu). Não é outra pessoa a não ser eu a abraçar o meu corpo, a tentar entender que está tudo bem – mas não está, nada. Normal que não tenham conseguido ver o que eu vejo em ti; porque fui eu que roguei para que me mostrasses o teu coração e todas as tuas cicatrizes – sou só eu para mim. Apaixonaste-te por todas as feridas, que sempre deixarão uma cicatriz, e para todas as cicatrizes haverá lembranças. As cicatrizes lembram-nos de onde estivemos e não o que somos ou fomos. Lembra-te de permitir que te beijem as cicatrizes e que as acariciem. Deixa que te dispam a alma, mas cuidado com quem o faz.

Vejo uma felicidade oculta que hipnotiza todos os teus seguidores cegos. Sabes de todos aqueles que não têm opinião própria e uma mente flexível e redescoberta. Sabes do que falo, certo? Nada é assim tão pessoal como defendes, visto que eles não viram o Mundo como nós o observámos; como nós o chorámos; como nós o gritámos. Deixemos de subestimar o Mundo; ele ri como Hades e convence-te de que está a morrer enquanto te mata primeiro. Não sou a favor de definições, mas essa tua mania de não amares ninguém, mas sim a obsessão pela tua violência, define-te.

Menina rendida aos oxímoros, aqui à frente ainda te vão conseguir revirar, mas não da mesma forma; não como se estivessem à procura de uma explicação muito lógica porque não é essencial terem explicações para tudo. Muito menos para nós. Muito menos para mim.

Já não me conhecem. Já não sabem quem sou; eu que sou o fundamento. No final, sou um ser aparentemente apaziguado e rendido à evidência da sua condição humana.