3 Julho 2022      12:05

Está aqui

A lenda dos quatro olhos

Era um dia de festa, mais propriamente da Festa da Santa Suzana, que se celebrava todos os anos naquele dia. E nessa mesma data vinham os filhos da terra que tinham ido para todas as partes do país, uns para mais longe, outros para mais perto, mas todos conheciam e reconheciam o caminho para a festa da Santa que nos últimos séculos ali tinha estado a ser respeitada por todos e a ser homenageada através de uma missa e do encontro de vizinhos e primos, e tios, irmãos e pais que por demasiado tempo não se viam. Alguns, só nesse mesmo dia se encontravam, dadas as circunstâncias. Era a festa da Santa Padroeira daquela localidade que foi freguesia até ao século XXVII.

Reza a história que num monte perto de Santa

Suzana, num dia que a mesma história não gravou, um cão velhote, cansado de viver e de ver os anos passar, latiu três vezes anunciando a sua partida. Estava numa fase em que os dias passavam por si sem que fosse capaz de correr atrás das cabras ou das ovelhas. Mais velho, quiçá, que os donos do monte e seus patrões, já não servia para guarda da propriedade.

Cansava-se muito e passava as folgas debaixo da azinheira mais velha, que era a única que lhe dava conforto, sem o confrontar com os seus problemas e que, ao mesmo tempo, o abrigava do calor. Na sua idade e com a camada de pelo não cuidado, contavam muito os momentos em que podia descansar e pensar no passado e no presente. No futuro não pensava pois nada lhe mostrava que pudesse vir a ter um.

Ao terceiro latido, o cão morreu. Morreu de velhice e consigo morreu a verdadeira história atrás da lenda dos 4 olhos. Muitos diziam que tinha sido uma cobra tão poderosa que hipnotizava todos com os seus quatro olhos…

Outros afirmavam que era um lobo, enfeitiçado por uma bruxa, que se transformava num ser com quatro olhos, seus braços e duas línguas.

Só Santa Suzana e o cão que agora cerrou o seu olhar sabiam o início e o fim da lenda. A Santa porque viu nascer aqueles que a ela dariam origem e os acompanhou até ao dia em que fecharam os olhos. O cão porque foi pela lenda constituído parte de si e graças a ele a lenda se tornou realidade e de novo voltou a ser lenda.

Nesse tempo, no dia em que o cão latiu três vezes, coincidindo com a festa de Santa Suzana, tudo mudou. Por fim foi possível descobrir quem e o que se encontrava atrás da lenda dos quatro olhos. Nesse dia, a lenda começou, a partir de um pedaço de cortiça, de três latidos de um cão e de uma imagem venerada de uma Santa que durante séculos protegeu os seus filhos e os filhos da terra.

E, por fim, o que é a lenda dos quatro olhos, anunciada pelo latido do fiel amigo do homem, no dia da Festa mais ancestral da aldeia?

Para a semana saberemos…