9 Novembro 2024      12:26

Está aqui

Há 35 anos derrubaram o muro de Berlim – voltarão a erguer-se muros mais a Leste?

Há 35 anos, a 9 de novembro de 1989, o mundo estava colado à televisão e vivendo um misto de alegria, medo e outras tantas emoções; o derrube do muro de Berlim, já que queda pode pressupor que ruiu, deixava o mundo em suspenso e, daí em diante, muito mudaria.

No pós-Segunda Guerra, a Alemanha, despojo de guerra, foi dividida entre os Aliados: de uma parte do muro, na parte leste de Berlim, controlava a antiga União Soviética; do outro, os outros aliados que venceram a guerra, com a Berlim Ocidental a ser dividida em três áreas de controlo sob domínio americano, francês e inglês.

Em 1989, o mundo vivia ainda na Guerra Fria - que de modo diferente, volta a assolar o planeta, não faltando interessados em que a Europa regrida a esses tempos, mesmo cá dentro – e que divida a Europa e os países entre amigos e inimigos, entre bons e maus, entre eles e nós.

Nos finais da década de 80, foi a abertura das fronteiras entre a Áustria e a Hungria, em maio de 1989, que funcionou como desbloqueador, levando a que milhares de alemães do lado oriental se manifestassem com regularidade, até que a 9 de novembro, na mítica Alexanderplatz, o governo da ex-RDA afirmasse que a passagem para o lado oeste estava permitida.

Milhares de pessoas aglomeraram-se nos pontos de controlo existentes e os guardas, sem qualquer ordem, não viram outro caminho que não fosse o de levantarem as cancelas e deixarem o povo passar.

No dia em que o muro foi derrubado, a 9 de novembro de 1989, há 31 anos, o então chanceler alemão, Willy Brandt, disse: "Cresce junto, o que é para estar junto". O muro que separou a cidade de Berlim em duas durante 28 anos - separando famílias e amigos - era derrubado.

O derrube do muro não só uma abertura de um mundo face a outro, de uma Berlim face a outra, mas essencialmente a junção de famílias, de amigos, de amantes; de cidadãos de uma mesma cidade e de um país estilhaçado pela guerra, pela segunda vez na História do mundo.

Em 1961, quando o muro foi construído, quase de um dia para o outro, sem aviso prévio, de um lado o mundo ocidental e do outro o controlo soviético. Foram quase 70 quilómetros formados por um conjunto de pedras, cimento e tijolos, com torres, redes metálicas eletrificadas, arame farpado e vigias apertadas com cães e tropas nada hesitantes em puxar o gatilho. Para a população não existia opção. Ditado pelo Este, ou pelo Leste, o muro, apesar de servir propósitos geopolíticos e económicos, nunca fora entendido por aqueles que sempre puseram valores como a liberdade, o amor, a união, a família, a felicidade à frente de qualquer bandeira, seja de que tipo for.

Até 1961, quase 3 milhões de pessoas deixaram para trás a Alemanha Oriental, controlada pela antiga ex-URSS, para entrar no capitalismo e modernidade dos Aliados. Ao aperceber-se dessa constante perda de população, a antiga RDA, na noite de 12 de agosto de 1961, decidiu levantar um muro provisório e fechar 69 pontos de controle, ficando abertos, mas condicionados, 12 e na manhã seguinte os berlinenses viram ser colocados 155 quilómetros de arame farpado e que separava agora as duas partes de Berlim. Os meios de transporte públicos deixaram de passar de um lado para o outro e o arame farpado foi dando lugar a tijolos e cimento.

Criou-se um perímetro em redor do muro que veio a ter o nome de “faixa da morte”, entre um e outro lado existiam 81 pontos de passagem, como aquele que é hoje um ex-libris da cidade, o “Check-point Charlie”, mas passar de um lado ao outro de Berlim tornou-se quase impossível, tendo morrido centenas de pessoas e sido detidas, só na parte leste, a parte russa, 75 mil pessoas acusadas de desertores, o que, segundo o código legal da ex-URSS, teriam que ser punidos com dois anos de prisão.

Quando em 1987, Ronald Reagan, discursando em Berlim, pede a Gorbatchev que derrube o muro, estendeu à Rússia a mão para a puxar para o Ocidente e para a Democracia. E conseguiu. Pelo menos enquanto Gorbatchev viveu. Depois vieram os irresponsáveis que abriram lugar aos oligarcas e a uma nova máfia; os que antes já tinham sacaneado e roubado o povo russo voltaram reciclados colocando Putin no poder; enquanto chovia dinheiro russo nos clubes de futebol ninguém se importou, e quando se importaram a Ucrânia já tinha sido invadida e a Europa Ocidental já estava energeticamente dependente da Rússia. Voltarão a erguer-se agora muros mais a Leste?

Berlim, é a maior cidade alemã e uma das que apresenta um dos maiores PIBs municipais. Viveu, neste dia de 1989, verdadeiros sentimentos de alegria; o mais intrínseco do sentimento humano andava à solta pelas ruas de Berlim. Um mundo parado no tempo chocou com uma realidade nova e a liberdade e a felicidade das pessoas foi contagiante: bares serviam bebidas gratuitas, as pessoas saudavam-se nas ruas como se fossem melhores amigos apesar de nunca se terem visto; Hitler, a ex-URSS, o pós-guerra, eram só sombras do passado face um futuro que a liberdade pintava a esperança.

Pedaços desse muro que outrora fora um empecilho à felicidade, passou a ser um exemplo da luta, da esperança por um mundo melhor e foi enviado para todos os cantos do mundo: no estaleiro de Gdansk, Polônia, no Museu Imperial da Guerra de Londres, no Newseum em Washington, em Nova York, no Hawai, em Buenos Aires, Seul, Fátima e na casa de milhares de pessoas.

Em 87, Reagan disse, no discurso antes referido, disse que a “liberdade e segurança caminham juntos, que o progresso da liberdade humana só pode reforçar a causa da paz no mundo”. No entanto, e 37 anos depois destas palavras, os muros que agora se erguem são novamente muitos. A começar no país de Reagan, nos Estados Unidos. Muitos já nem são de cimento, mas são mais repressivos. A evolução e a sensação de Liberdade extrema levaram a que muros fossem erguidos entre as sociedades e dentro das sociedades, de um modo em que cada ser é quase conivente e consciente da criação desses muros, sem que isso o incomode minimamente.

Isaac Newton disse que “Construímos muros demais e pontes de menos.” Todos compreendemos a mensagem desta frase, mas chegámos a um ponto de “involução” em que surgem novas perguntas: é possível construir pontes com quem nos quer ferir? É possível derrubar muros face a quem nos quer prejudicar?

A Europa e o mundo dedicaram-se excessivamente - e quase em exclusivo - a uma lógica com base no objetivo do lucro económico mais do que a felicidade e sustentabilidade da sua população. O resultado está à vista: um regresso ao passado em que cada dia pode trazer novidades que colocam em causa a Paz.

 

Imagem de wikimedia.org