Tarde de domingo. O vento bate na janela, acompanhado pela chuva incessante, que desde meados da semana não dá tréguas. É a depressão Jana a fazer das suas. Uma volta pelas redes sociais dá a conhecer as ribeiras cheias no Alentejo, como há muito não se via. O inverno tem sido duro.
Para além dos resquícios do Carnaval, conseguimos ler alguns desabafos sobre a vida, os sentimentos, as vitórias e as perdas.
Pontualmente, surgem algumas reflexões sobre o que se passa na atualidade. Talvez os mais atentos e preocupados se mostrem apreensivos sobre o estado atual das coisas. Olhamos lá para fora, muito para além da janela cheia de gotas de chuva. Trump, Zelensky, Putin, tornam-se nomes familiares, que já fazem parte da nossa rotina diária. Os Estados Unidos, a Rússia e a Ucrânia tomam conta da atenção internacional. Saltam à vista os “memes” e as alegorias referentes a todos estes protagonistas da nova ordem mundial. As notícias chegam a este cantinho do Alentejo.
Um pouco desiludidos com o que se vê nas redes sociais, passamos para o grande ecrã. A chuva não dá sinais de abrandar.
Ouvimos falar da guerra comercial à vista, da Gronelândia e de uma subtil vontade imperialista dos Estados Unidos (em tudo semelhante à da Rússia), das terras raras, das tarifas, das movimentações militares na Ucrânia, entre os avanços e recuos, os bombardeamentos e os mortos. Dezenas de conceituados comentadores fazem a sua análise ao que se passa, tomando partido de um lado ou de outro, trazendo à luz argumentos retirados de sites internacionais, muito provavelmente fictícios, sobre o desenrolar da guerra.
Militares, jornalistas, especialistas em Direito Internacional refletem sobre o que se passa a leste, sobre o perfil de Putin, a sua amizade com Trump e do ódio de ambos à Europa. Há várias razões para o conflito nas portas da Europa, que se traduzem em interesses económicos, razões políticas de controlo de territórios e de influência geoestratégica sempre presentes na mente dos poderosos para controlarem o Mundo.
Já para não falar da China e da sua silenciosa e aparentemente discreta ação a oriente, sempre à espreita para lançar os canhões em direção a Taiwan. Na faixa de Gaza, uma paz frágil, feita de cristal fino, não parece dar garantias de futuro. Olhamos para a Síria, em que se mudam os regimes, mas o cheiro da morte continua a pairar, de forma ininterrupta.
De repente, parece que o mundo se tornou num lugar muito perigoso. Ou será que sempre foi assim e só damos conta disso agora, quando temos à nossa porta europeia a imagem do sofrimento, da perda, da destruição e das armas?
Fecho os olhos e penso: será que tudo isto não é somente uma triste história de ficção? Será que depois de tudo aquilo que a Humanidade já passou, tenhamos chegado a este ponto? Não aprendemos com o passado?
O mundo está em ebulição. Muitas perguntas e dúvidas condicionam claramente o nosso futuro. A Europa adormeceu, embalada pelo sonho de uma paz adquirida, em que os valores que defendemos se iriam sobrepor a quaisquer interesses expansionistas, que muitos estados neste momento vivem e que provavelmente, sempre ambicionaram. Nunca se desligaram dessa vontade em exercer a sua influência. Os tiranos sobem ao poder e ficamos, impávidos e serenos, a assistir à ascensão de líderes de capacidade duvidosa, com interesses obscuros, um pouco por toda a parte.
Dizem que na Europa, os líderes inspiradores não existem. Os tempos mudaram e na hibernação em que nos vemos mergulhados, somos hoje confrontados com o abandono dos EUA e com a irónica satisfação russa. Uma nova corrida ao armamento? Há que dotar o continente europeu de novas formas de defesa, face à ameaça de Putin. Diz-se nos corredores de Bruxelas que se a Ucrânia cair, seguem-se a Polónia e todos os países da antiga Cortina de Ferro. O medo está instalado. A ambição de Putin não conhece regras.
Preocupado com o cenário internacional, olho para dentro de portas. Moções de censura, moções de confiança, CPI, um Primeiro Ministro aparentemente debilitado na sua faceta ética e um cenário de instabilidade à vista. O governo cai ou não? Valerá a pena cair? Não haverá fórmulas para pensar primeiro no país e depois nas estratégias partidárias?
As autárquicas, já agendadas, estão quase à porta. Novas eleições legislativas vêm trazer transtornos e despesas desnecessárias. Podem dizer-me: é a democracia a funcionar. Mas será que o cenário pós-eleitoral fragmentado que temos hoje em dia se vai alterar? Tenho muitas dúvidas. Mas tenho mais receio que todos estes acontecimentos venham dar mais votos aos partidos populistas, que se apoiam nesses episódios para tentar ganhar força, como se não tivessem também eles problemas para resolver no seu seio.
Penso que o bom-senso deve imperar. Há sinais positivos na economia e alguns problemas por resolver, nomeadamente na Saúde. Deixemos o governo governar, apesar dos erros ou omissões que eventualmente possam ter acontecido. Há outras prioridades e emergências neste momento.O mundo está transformado num lugar imprevisível e perigoso. Devemos pensar no futuro das nossas famílias, dos nossos filhos e do nosso país. Há muita coisa em jogo e devemos ser cautelosos, preparando o caminho para os desafios que surgem no horizonte.