15 Fevereiro 2021      11:49

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Crianças de Évora promovem cidadania com jornal escolar

Fernando Moital e a sua Comunidade das Escolas de Santa Clara e Horta das Figueiras em Évora são destaque no Público. O responsável agora quer construir uma “traquitana” para levar o jornal escolar, premiado pelo jornal, a miúdos e graúdos.

Em declarações ao Público, Fernando Moital diz que “sempre achei que era possível aos mais pequenos fazer imensas coisas numa sociedade que defende o oposto”. Formado nas áreas de agronomia e ensino, despertou muito cedo para as questões relacionadas com ambiente, cidadania e participação. Mas só quando o filho, João, entrou na escola primária, sentiu a “necessidade de estar mais presente” e “fazer coisas” no sentido de promover o debate e reflexão sobre estas problemáticas junto da população escolar.

Contudo, o início do grupo não foi fácil. Quando Fernando abordou a escola para realizar uma projeção de cinema, “um meio ótimo para unir pessoas e promover a discussão”, recebeu uma resposta hesitante e inflexível, que se justificava com a falta de recursos humanos e materiais para concretizar a atividade. Assim, a ideia acabou por morreu ali.

Foi apenas mais tarde, quando Fernando Moital, utilizador diário de bicicleta e acérrimo defensor da mobilidade suave, resolveu colocar um estacionador de bicicletas dentro da escola, inserida no perímetro de um bairro social, “depois de terem sido vandalizadas duas ou três vezes as que se deixavam cá fora”.

De acordo com Fernando, “demorou bastante, mas a junta [da União de Freguesias Horta das Figueiras e Malagueira] finalmente colocou ali um estacionador” em 2018, cedido pela loja de bicicletas do bairro D’BIKE. Passados alguns meses, “foi vandalizado de novo”. Fernando arranjou então outro estacionador, preparado para fazer um de raiz, com paletes, se fosse preciso. Na altura, “disse à professora, ‘Se não for possível aqui dentro, fazemos na rotunda em frente’”. Foi a partir daí que ganhou a confiança da escola e abertura para fazer diversas atividades nos anos seguintes.

Em 2019, criou o projeto “Semeando Democracia”, uma simulação do processo eleitoral com as crianças, que teve como pretexto as eleições europeias e, depois, as legislativas. “A participação também se ensina, e fazê-lo com crianças é meio caminho andado para termos adultos participantes”, observa Fernando Moital.

Para o responsável, “quanto mais cedo se começa este diálogo, melhor”. Primeiro, porque “o tempo passa a voar e rapidamente eles podem votar ou ser eleitos”, depois as experiências que teve com crianças e jovens tornaram claro que a mobilidade, por exemplo, tem de ser abordada urgentemente. “Até aos 14 anos, o sonho deles era ir de bicicleta para a escola, a partir dos 15 já era andar de mota. Já estavam perdidos para esta causa”, brinca.

Este trabalho, apesar de “exigente” torna-se crucial para aumentar a participação, muitas vezes impedida por diversos fatores como o sistema que faz das escolas um “fichódromo” e desconsidera a relação com a comunidade, falta de tempo ou contexto socioeconómico.

No ano passado, para combater o marasmo do confinamento, o grupo criou um jornal escolar. Depois de alguns números virtuais, o Horta das Notícias chegou ao papel em julho, com apoio da Câmara Municipal de Évora e, em setembro, lançou-se ao Concurso Nacional de Jornais Escolares do Público, tendo ganhado no seu escalão. O prémio no valor de dois mil euros vai ser usado no projeto “Fazer é melhor que ver”, que tem como objetivo construir um aparelho móvel para fazer um jornal verdadeiramente participativo. “A ideia é criar um painel que vá ao exterior da escola onde os pais possam lê-lo e contribuir para ele”.

Assim, nas últimas semanas, Fernando tem reunido com 12 crianças entre 10 e 13 anos, um serralheiro e dois designers, via Zoom, para discutir os critérios e características da “traquitana” que servirá de suporte à publicação. Já foram apresentados dez projetos, dos quais serão pré-selecionados três, que serão depois submetidos ao concurso “O Poder do Design”, da Universidade do Porto, que procura “ideias de design impactantes, mas que, em simultâneo, sejam simples e capazes de restabelecer o convívio interpessoal seguro”.

 

Fotografia de publico.pt