10 Dezembro 2020      13:04

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Banco Alimentar de Beja receia só poder apoiar famílias até janeiro

O número de associações dedicadas ao apoio a famílias com graves problemas de subsistência em 13 dos 14 concelhos do Baixo Alentejo passou de 30 para 65, entre a primeira e a segunda vaga pandémica, adianta ao jornal Público o presidente do Banco Alimentar Contra a Fome (BACF) de Beja, Tadeu de Freitas.

De acordo com o responsável, os números expõem um panorama “preocupante” que pode vir a ter um desfecho “assustador” a curto prazo, mais precisamente a partir do final do próximo mês de janeiro. Segundo o presidente, “os pedidos chegam-nos em crescendo através das instituições de assistência dispersas pelo distrito de Beja ou através do correio eletrónico”, acrescentando que o “aumento do número das famílias carenciadas” impôs um programa de emergência alimentar com a distribuição de “quase uma centena de cabazes” com vários produtos alimentares. Tadeu de Freitas prossegue afirmando que “é que esses cabazes que, à partida, seriam para suprir necessidades pontuais, se tornaram mensais.” Ou seja, as famílias não conseguiram recuperar a sua autonomia alimentar.

Note-se que a campanha de recolha de alimentos foi suspensa, e assim o banco alimentar tentou atenuar os seus efeitos na escassez de produtos através do contributo de instituições locais para repor cinco alimentos considerados essenciais: conservas de atum e salsichas, papas para bebé, grão, feijão e leite.

No entanto, Tadeu Freitas diz estar “preocupado” com a campanha virtual, baseada nos vales de compras, aceites pelos clientes das superfícies comerciais que são convertidos em alimentos para a instituição. “A maioria das pessoas nem sabe que a campanha existe”, constata o presidente do BACF. Os funcionários, nas situações que observou, “não promovem os vales e assim as pessoas não dão o seu contributo.”

Adicionalmente, o responsável destaca outro condicionalismo: a data de validade dos produtos. “Quando apelámos para os contributos dos cidadãos e das empresas nas últimas semanas,” após o quase esgotamento das reservas que o banco alimentar tinha para fornecer às 65 associações, “houve várias ofertas que repuseram os stocks, mas não pudemos encher o armazém de leite”, pois tem apenas dois meses de validade. Já os “produtos enlatados o prazo de validade varia entre um e dois anos”, garantindo outra margem de manobra.

No caso do Banco Alimentar de Beja, são necessários, mensalmente, entre 1500 e 1600 litros de leite para satisfazer as necessidades básicas das 2800 pessoas referenciadas. Há cerca de duas semanas o banco alimentar lançou um apelo à comunidade quando a quantidade deste produto nos armazéns do BACF era de apenas 500 quilos, e várias instituições responderam ao apelo com as suas contribuições, nomeadamente o Grupo de Forcados Amadores de Beja e os funcionários da empresa Conta Viva.

Quanto à Caritas Diocesana de Beja, a situação encontra-se um pouco mais folgada depois de a instituição ter realizado uma campanha de recolha de alimentos em abril com a colaboração da Associação de Olivicultores do Sul – Olivum, que angariou cerca de 330 litros de azeite. Também os contributos do Grupo de Forcados de Beja, assim como do Colégio Nossa Senhora da Conceição, do Clube Desportivo de Beja e trabalhadores da Biblioteca Municipal José Saramago em Beja permitiram a recolha de 1600 quilos de alimentos.

Em declarações ao Público, Isaurindo Oliveira, presidente da Caritas, garante que “neste momento não temos problemas prementes que dificultem o fornecimento de alimentos às pessoas que apoiamos”. Contudo, a instituição enfrenta outros desafios. “Antes da pandemia apoiávamos 350 pessoas, agora são o dobro. Estamos com 700 e a maioria no concelho de Beja”. Recorde-se que a área de intervenção da Caritas abrange os concelhos de Beja, Ferreira do Alentejo, Cuba e Vidigueira.

Entretanto trabalhadores de empresas e associações juntam-se em movimentos espontâneos para garantir às famílias carenciadas alimentos básicos. Por exemplo, à entrada do campo de jogos do Clube Desportivo de Beja houve uma campanha de recolha de produtos. Tânia Barnabé, dirigente do Desportivo de Beja e funcionária numa instituição de apoio a famílias pobres, explicou que a iniciativa, para além da recolha de alimentos, “pretende sensibilizar a população para a importância social da partilha na altura crítica que estamos a viver”.

Para a dirigente, “se antes da pandemia já era difícil socorrer quem é pobre, com o confinamento tornou-se dramático”. “Agora juntam-se analfabetos, licenciados e estudantes”, pessoas que não estão abrangidas pelo Rendimento Social de Inserção e têm de pagar rendas de casa e não têm condições para assegurar duas refeições diárias. Mais grave é quando “o pão passou a ser prioritário em detrimento dos medicamentos”, afirma.

Já Tadeu Freitas antecipa que “as maiores dificuldades vamos registá-las em fevereiro”. Depois dos acontecimentos que marcaram negativamente o apoio a Pedrogão “perdemos apoios e verificámos que quem ajudava tem agora relutância em fazê-lo por recearem que a ajuda que podem prestar não chegue a quem se destina. Já não se acredita no mediador Estado”, conclui o presidente do BACF de Beja.

 

Fotografia de ointerior.pt