13 Agosto 2022      09:56

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A ameixa

Nascida de uma pequena semente, caroço de uma saborosa ameixa, plantada por um homem de idade avançada, com esperança que os filhos e os netos dela fizessem uso, a ameixeira passou de semente a rebento. Assim

Foi crescendo e crescendo e crescendo. Todas as estações passar por ela. A pequena ameixeira. Não sei se ela tinha noção que era ameixeira e que cresceria, e cresceria, e um dia daria flores, e das flores nasceriam frutos, que seriam comidos por pássaros ou por humanos e que deles sairiam novas sementes e essas sementes dariam novas ameixeiras.

E agora que já dissertei o suficiente sobre o processo evolutivo de uma ameixeira, utilizando até à exaustão o verbo crescer, em diferentes modos e tempos verbais, falemos sobre a ameixa em si, o centro do nosso texto desta semana.

Nascida numa ameixeira igualzinha à que nos primeiros parágrafos se descreveu, a ameixa desta história tornar-se-ia a maior do seu ramo, e atrevo-me a dizer, de toda a árvore. No meio da serra, co-habitou com outras árvores de fruto que compunham aquela horta. Não falava muito com os pessegueiros, nem com as melancias ou os melões. Estes últimos eram demasiado sazonais e etéreos.

Não falava também com as macieiras ou com as pereiras. Embora perenes, só mais tarde surgiam. Os limoeiros e as limas eram demasiado ácidos para manter uma conversa. A nossa ameixa olhava ao seu redor e tudo lhe parecia um mundo estranho. Tendo crescido mais do que devia, ela própria se achava estranha junto daquelas que eram suas semelhantes. Pior, na mesma horta, habitavam muitas outras espécies de ameixas… cultivadas da mesma forma, nasciam diferentes. Um pouco à semelhança de nós, seres humanos. Estranhamos as outras árvores, sem procurar entender o seu lugar no nosso jardim, estranhando ainda mais os que comungam da nossa espécie, mas são diferentes em formato ou cor.

A ameixa cresceu. Nascida da alva flor, com um toque de pólen, gratuitamente oferecido pela simpática abelha, sujeita ao passar da estação e ao calor, foi amadurecendo e tornou-se adulta, ou seja, madura. Por sorte, durante todo o processo, não foi bicada por um dos pássaros furtivos, nem levou com químicos!

Viveu até que o açúcar a tornou a mais esbelta ameixa do quintal. As outras olhavam-na, ela retraia-se. Não havia ameixa mais bela.

Dia 13 de agosto, um sábado, o avô, que tinha plantado todo aquele quintal, levou as netas e mostrou-lhes o processo da vida. No caminho,

Trouxe um cesto repleto de frutos, onde a ameixa constava. Pouco será dizer que foi o alvo da disputa entre as netas e que, após divisão, todas ficaram satisfeitas.

Com o açúcar da ameixa a cair pelos lábios, as linhas presas no meio dos dentes, sobrou apenas o caroço. Atirado para o meio do quintal, de novo nascerá.

Estou certo de que daqui a alguns anos alguém escreverá sobre a descendente da nova ameixa. Esta cumpriu o seu ciclo, e que doce foi.