25 Janeiro 2016      13:12

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A TENSÃO INTERNACIONAL E A SUA ESCALADA EXPONENCIAL…

“ENTRE NAÇÕES”

Estaremos 71 anos depois do “Dia da Vitória” à beira de um novo conflito de escala global?

Como primeira intervenção que redijo para este respeitável espaço noticioso, decidi abordar uma temática latente de há vários anos a esta parte no panorama internacional, e de elevado grau de preocupação para a comunidade internacional.

Tem-se assistido nos últimos anos àquilo que se pode chamar de escalada de tensão no sistema internacional, não existe ao certo uma data que demarque um início para tal fenómeno, nem tal faria sentido pois a tensão internacional sempre existiu de uma forma flutuante quanto à sua intensidade. Entre 1945 e 1991 a tensão entre o bloco soviético e o bloco ocidental oscilou entre picos de eminente conflito (sempre evitado de forma directa entre EUA e URSS), e períodos de coexistência pacífica já perto da queda da URSS. Não obstante, esse conflito de larga escala que nunca aconteceu nesse período temporal, acaba por estar encapotado em “pequenos” conflitos em zonas geográficas distintas entre as duas potências da época (presuma-se EUA e URSS), mas sobretudo entre as duas correntes ideológicas em disputa na época (presuma-se Capitalismo e Comunismo), como a Guerra do Vietname “ganha” pelo Comunismo, a Guerra da Coreia que ficou “empatada” no paralelo 38 e que assim continua até hoje, e a Guerra Afegã-Soviética “ganha” pelo Capitalismo. Entre 1991 e 2001 viveu-se uma época de menor tensão devido à recente unipolaridade do sistema internacional. E a partir de 2001, os atentados do 11 de Setembro resultaram numa nova alteração no “termómetro internacional”, catapultando o terrorismo para o primeiro lugar da categoria de “ameaça maior” nas agendas governamentais desde então, gerando focos de tensão entre os agentes do terror e o mundo ocidental.

O que acontece desde há 14 anos para cá consiste num acumular de focos de tensão um pouco por todo o globo, cada um deles apresentando um exponencial aumento de intensidade à medida que os desenvolvimentos ocorrem. O que nos faz pensar, qual será a gota de água que despoletará uma acção em cadeia que nos possa enviar de novo para um conflito de larga escala. Ou seja, qual será o foco de tensão que fará mover peças suficientes para despoletar um conflito de tal ordem? Será possível? A resposta não é conclusiva, nunca existem certezas de como cada governo irá reagir, portanto essa resposta à priori será “Talvez”. Da experiência reza que uma grande guerra não tem que começar necessariamente por um grande motivo. Veja-se a 1ª Guerra Mundial, tudo teve início num assassinato do herdeiro do trono da Áustria-Hungria na Bósnia, à partida um assunto de importância regional, transforma-se numa das maiores guerras da história. Aplicando esse raciocínio para a época actual podemos perguntar-nos: Será uma organização como o Daesh capaz de despoletar um tumulto de tal ordem? Será o Multiculturalismo uma ameaça à estabilidade social e política na Europa? Serão as disputas do Mar do Sul da China ou das Ilhas Senkaku uma ameaça à estabilidade da região Ásia-Pacífico que é actualmente considerada o maior centro económico mundial? Serão estes focos “menos capazes” face ao atentado fatal ao arquiduque Franz Ferdinand?

Vamos então percorrer brevemente os principais focos de tensão dignos de alerta presentes no mapa mundi da actualidade.

 

Irão vs Arábia Saudita

Comecemos com o assunto mais “fresco” nas cadeias noticiosas, a escalada de tensão entre Irão e Arábia Saudita, que já levou ao corte de relações entre os dois países, motivados pela execução de 47 Xiitas por parte da monarquia dos Al-Saud, que nos transporta para o “eterno” conflito religioso contínuo entre Sunitas e Xiitas. Antagonismos religiosos e fundamentalmente políticos entre estas duas nações podem despoletar acções de cariz coercivo numa região do globo que é por si só uma bomba relógio num agregado de alianças, amizades, ódios milenares e discordâncias altamente complexo… O Médio Oriente!

 

Disputas territoriais marítimas da República Popular da China

Passemos agora revista às disputas territoriais chinesas no seu mar em redor. A China disputa neste momento com o Japão as pequenas Ilhas Senkaku, não se sabe ao certo qual será a justificação de tamanho interesse por um arquipélago minúsculo e remoto como este, suspeita-se da existência de recursos naturais no mar em seu redor, o que é certo é que os movimentos militares na zona têm-se intensificado, bem como os avisos e ameaças constantes entre os dois governos. Como se tal não fosse suficiente, a República Popular da China, mais a sul, no Mar da China Meridional, coloca as suas pretensões sobre as zonas económicas exclusivas de Indonésia, Malásia, Filipinas, Brunei e Vietname, ocupando várias pequenas ilhas, e construindo outras tantas artificiais, “tomando” o território nacional marítimo destes países, na tentativa de alargar o seu próprio poderio territorial marítimo, também estas acções motivam há vários meses constantes movimentos militares e avisos constantes entre nações.

 

Daesh / Estado Islâmico / ISIS / ISIL

Passemos de imediato para a questão Daesh, também referido como Estado Islâmico, ISIS ou ISIL. Este autoproclamado Estado Islâmico, que não é um Estado (reconhecido), nem é islâmico, nem representativo do verdadeiro Islão, nem metodologicamente algo em que os Islâmicos se reveem, existe desde 1999, mas no entanto apenas a partir de 2013 deu início à expansão territorial e mediática a que temos assistido desde então. Esta organização, capaz das maiores atrocidades alguma vez levadas a cabo por seres humanos no século XXI, desde decapitações, degolações, incenerações, fuzilamento de adultos e crianças considerados “infiéis”, entre outras desumanidades, representa talvez a maior ameaça à humanidade e aos valores desde o Nazismo, derrotado em 1945. Charlie Hebdo, Bataclan, Paris e Copenhaga são expressões bem presentes na memória recente derivado a esta organização. Organização esta forte em recursos financeiros, forte em ideologia, forte em fidelidade à mesma, a crescer territorialmente e preparada para um conflito de longa duração, representa actualmente uma das maiores ameaças à estabilidade das regiões Médio Oriente, Norte de África, Península Europeia e Ilhas Britânicas, prometendo não desistir da luta, e lutar até à morte do ultimo combatente. Conglomerando-se no maior foco de tensão a nível global, que caso não seja neutralizado o mais rapidamente possível, a sua expansão poderá a médio prazo, garantir-lhes os recursos necessários para provocar e travar um conflito de larga escala num futuro próximo, ou até mesmo conseguir acesso a armamento nuclear, acontecimento que poderia representar a maior tragédia humana da história.

 

Tensão na Península da Coreia

A Península da Coreia é já considerada um habitué na matéria da tensão internacional. Dividida no paralelo 38 desde 1945, ocupada a norte pela URSS e a sul pelos EUA, entre 1950 e 1953 foi palco de um conflito entre o norte, apoiado pela URSS e China, e o sul, apoiado pelos EUA, Reino Unido entre outros. Tecnicamente a Guerra das Coreias perdura até hoje, pois nunca foi assinado um tratado de paz, mas sim um armistício que decretou o cessar-fogo entre as partes. Até hoje a tensão perdura entre os dois regimes de forma flutuante. Recentemente Pyongyang concretizou com sucesso um ensaio nuclear com uma bomba de hidrogénio, à qual foi dado o nome de Bomba H. Episódio esse que enfureceu os vizinhos de Seul, que voltaram a ligar os altifalantes colocados na fronteira com propaganda contra o regime de Kim Jong-un, e a emitir avisos de possíveis respostas a tais actos que Seul considera provocatórios. A Península da Coreia figura desta forma num dos maiores focos de tensão internacionais pela via de os seus respectivos aliados pertencerem também eles a blocos ideológicos distintos, sendo aliados naturais da Coreia do Sul, os EUA, o Reino Unido e restante “mundo ocidental”, e sendo aliados naturais da Coreia do Norte, a República Popular da China e Rússia. Um conflito entre estas duas nações disporia de todas as condições para despoletar um conflito de larga escala, caso houvesse um défice de zelo entre os respectivos aliados e respectivas diplomacias.

 

Conflito Sírio

A durar desde 2011, motivado pelos tumultos provocados pela primavera árabe, o conflito sírio passou de um conflito interno entre forças anti Assad e exército Sírio, para em 2014 se tornar palco para uma das guerras mais sectárias desde o conflito dos Balcãs ocorrido entre 1991 e 2001. A chamada Guerra Civil da Síria, conglomera actualmente cinco grandes actores no terreno, o Exercito Sírio, as Forças Anti-Assad, as Forças Curdas, o Exército do Daesh, e a Frente Al-Nusra, cada parte com território sírio na sua posse. Sendo que os quatro grandes actores contam com apoios diferentes, de diferentes iteresses. O Daesh cujo objectivo é a concretização do califado, e sendo apoiado por iniciativas privadas e tráfico de tudo o que lhes seja possível traficar, sendo petróleo o seu principal produto de tráfico. O Exército Livre da Síria representando a oposição anti Assad tem como objectivo o fim do regime de Bashar al-Assad e a deposição do mesmo, e foram alegadamente apoiados por países como Israel, Turquia, Arábia Saudita e EUA antes de ser criada a Coligação Internacional “Determinação Inerente”, não havendo certezas quanto à cisão desse apoio. Por outro lado, o Exército Sírio, forças fiéis a Bashar al-Assad, têm por objectivo a manutenção do regime vigente e são alegadamente apoiados pelo Hezbollah, e países como Rússia, Irão, Iraque, e fala-se remotamente de apoio por parte da República Popular Democrática da Coreia (Coreia do Norte), Bielorrússia e Cuba.

 

Denota-se a diferença de partes entre países tendencialmente discordantes como EUA-Rússia, Arábia Saudita-Irão, Israel-Irão entre outros. E finalmente a facção curda, a Rojava ou Curdistão Sírio, apoiados pelos partidos turcos do PKK e MLKP, e mais recentemente pela Coligação Internacional combatem a norte as forças do Daesh, cujo objectivo é a contenção do mesmo, e ao mesmo tempo uma intenção de autodeterminação do povo curdo na região. Todos estes desenvolvimentos são passíveis de gerar discórdia internacional entre potências, relativamente aos diferentes apoios e intervenções externos às várias facções, aumentando a tensão entre nações, como já aconteceu aquando do abate de um avião militar russo por parte das forças turcas. Coroando este conflito, como o foco mais “aceso” e passível de provocar um conflito de maiores dimensões.

 

Multiculturalismo na Europa

Este é sem dúvida o foco de tensão mais próximo e que mais nos diz respeito como europeus. É certo que a Europa é uma manta de retalhos de nações distintas, línguas distintas, culturas distintas e interesses igualmente distintos, mas que se conglomeram numa identidade europeia comum que nós ainda não sabemos definir com precisão mas sabemos que existe e que nos distingue das civilizações “extraeuropeias”. Mas sobretudo a nossa maneira de receber e acolher ainda difere muito, tendo em conta o sítio onde se recebe. A maneira de receber dos nórdicos não é igual à dos europeus do centro, a maneira de receber dos países de leste também não é igual à maneira de receber dos mediterrânicos e assim sucessivamente. E muitas das maneiras de receber foram de certa forma descuidadas, e não as mais adequadas. Descurou-se a integração desses povos na sociedade de acolhimento, e passou a fazer-se uma “guetização” (de: Gueto) desses mesmos povos, não os moldando e educando para se inserirem na sociedade de acolhimento. Em suma, colocámos povos em território europeu a viver em comunidade guetizada e isolada da restante sociedade, o que levou esses povos a criar hábitos de vida iguais aos que tinham nos seus países de origem. Hábitos esses que não se enquadram com a visão europeia de sociedade nem com os valores europeus, o que levou a haver frequentes choques civilizacionais dentro dos próprios países acolhedores. Servem como exemplos disso mesmo os tumultos frequentes nos arredores de Paris ou de Londres, onde esses “guetos” sociais modernos comummente são instalados. O que leva a aumentos de criminalidade e intervenções policiais. E actualmente a Europa está de certa forma a pagar o preço dessa má integração, e acrescendo a tudo isso, está a lidar com uma das maiores variações demográficas de que há memória, a chamada “Crise dos Refugiados”, o que ainda inflaciona mais a discussão entre países da União Europeia acerca de como devemos receber estes fluxos, ou até mesmo se os devemos receber. Esta discussão é de facto um foco de tensão que nos deve preocupar enquanto europeus, pois poderá resultar em fortes desacordos entre as nações europeias a pontos de criar divisões no seio da própria UE, aumentando ainda mais a tensão que se acumulou ao longo da crise que dura desde 2008. Um conflito armado resultar deste foco de tensão é de probabilidade reduzida, mas os impactos que esta temática poderá ter na estabilidade europeia, poderiam resultar num redesenhar do mapa político europeu, o que poderia ditar uma desestabilização no panorama internacional, com diversas consequências de âmbito económico, social e político resultantes de tal alteração.

Concluindo, muito mais haveria para ser dito acerca da tensão internacional e de diversos focos não referidos como a questão da Crimeia e do conflito ucraniano, das disputas territoriais entre China e Índia ou Índia e Paquistão, dos constantes ciberataques entre potências, da Líbia como Estado falhado e paraíso para células terroristas, do grupo Boko-Haram na Nigéria, um franchising do Daesh, entre outros focos mais ou menos beligerantes. A verdade é que todos estes focos não são de menor menosprezo em relação ao acto de Gavrilo Princip na fatídica manhã de 28 de Julho de 1914, quando premiu o gatilho da pistola que matou o Arquiduque Franz Ferdinand, o mesmo gatilho que despoletou um dos conflitos mais sangrentos da história da humanidade, um gatilho que indirectamente matou 19 milhões de seres humanos. Serve este argumento para relembrar que não vivemos alheios a outro conflito de larga escala, e que a mais pequena faísca pode despoletar um evento de escala planetária, tudo dependerá do zelo e ponderação que os diferentes governos e diplomacias apliquem na sua tomada de decisão. Decisão essa que será sempre tomada por um ser humano. Ser humano esse, que tal como todos os outros, está munido da capacidade de… Errar!

 

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