23 Março 2018      12:17

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Os Sinais

É verdade que parece que volto a um assunto semelhante ao do artigo anterior e talvez por isso me sinta constrangido por admitir que vocês, os leitores, se fartem do que escrevo. Mas eu, na maioria das vezes, escrevo por impulsos e por sentimentos de alma, e é por isso que volto à liberdade.

John Rawls escreveu que a escolha, numa sociedade, entre o que é justo e injusto é “a escolha que será feita por sujeitos racionais nesta situação hipotética em que todos beneficiam de igual liberdade…”. Mesmo que simples, este posicionamento básico que permite um justo “contrato social”, coloca-nos a todos e todas numa situação de “igualdade original” que é hoje, talvez tenha sido sempre, objeto das maiores agressões.

A luta, que muitos insistem em travar, pela posição dominante, que fragiliza a liberdade de todos os outros, é muitas vezes adornada e/ou mascarada com uma retorica paternalista de sacrifício pelo serviço ao outro. Os “queridos lideres” ou os “grandes timoneiros” sempre se foram apresentando como heróis coletivos. Vale a pena ler o que Amartya Sen diz sobre isso em “o desenvolvimento como liberdade”.

É curioso que se juntarmos as pulsões ainda mais totalitárias, que sempre existiram, associadas aos recentes eventos nos dois “grandes impérios” como são a Rússia e a China sentimos que nada de novo se passa no mundo. Se olharmos para o caos africano, se olharmos para a deriva da América Central e do Sul no sentido de pequenos/grandes totalitarismos e se olharmos para a ascensão de partidos xenófobos e nacionalistas na Europa ficamos a pensar que algo se passa no mundo. Ou não!?

Ouvi dizer, por estes dias, que é o povo que assim quer. Ouvi dizer que o povo Russo quer Vladimir Putin, que o povo dos Estados Unidos da América quer o Donald Trump e que o povo Britânico quis o “Brexit”.

Depois, por entre a chuva destes dias, vem célere e de proporções incríveis uma certa informação de que os nossos dados, sim de 2 mil milhões de utilizadores do Facebook, estarão disponíveis para que, com a ajuda de um qualquer algoritmo, nos possam manipular. É curioso pensar que os “gostos” que fazemos e onde fazemos, as coisas que partilhamos e os comentários que fazemos são “produtos” que outros podem utilizar para nos conduzirem a escolhas que eles querem que façamos em aparente liberdade.

Ficamos a saber que os dados de 50 milhões de pessoas foram utilizados para construir informação que, colocadas na rede social, lhes sugerisse, a cada um desses 50 milhões de pessoas, reações e/ou tomadas de decisão adequadas a quem manipulou. Ficamos a saber que esse tipo de informação foi utilizado nas eleições presidenciais dos Estados Unidos da América e no referendo ao “brexit”. Ficamos a saber que talvez as pessoas não tenham decidido em liberdade!

Ficamos sem saber em que mais podem as pessoas estar a decidir amputadas da sua condição original de liberdade e por isso podem não estar a decidir com justiça.

Os responsáveis pela rede social Facebook apressaram-se a dizer que nada ficará como dantes, que foram enganados, que apertarão as medidas de segurança e que haverá maior transparência. Será que isto que agora nos dizem é apenas aquilo que querem que ouçamos!?

As redes sociais são locais de elevada exposição das pessoas, são locais de encontro (alguns inesperados e felizes), são locais de manifestação/afirmação e até locais de aparente partilha. São, assim, um dos locais onde as pessoas são mais frágeis, mais disponíveis e mais suscetíveis pois, sozinhas em frente ao ecrã do seu telefone, não existem filtros para se exprimirem e/ou para se emocionarem.

Sei que são apenas sinais de um mundo que se vai construindo e que nos vai empurrando para um novo “contrato social” onde as nossas escolhas são feitas numa aparente liberdade. Ás vezes pergunto-me se terá sido sempre assim?