5 Dezembro 2017      16:42

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ÉVORA REVISITA MAX WEBER CEM ANOS DEPOIS, NUM TEMPO DE PRECÁRIOS NA CIÊNCIA

Cem anos decorrem desde a célebre conferência de Max Weber na Universidade de Munique, acerca da vocação para a ciência e que a Universidade de Évora pretende revisitar num seminário que decorre no próximo dia 7 de dezembro, às 14h30, no Anfiteatro 131 do Colégio do Espirito Santo da Universidade de Évora.

A Comissão organizadora está a cargo de: Ema Pires, Professora da Universidade de Évora e Investigadora no IHC – Instituto de História Contemporânea, no grupo do CEHFCi – Centro de Estudos de História, Filosofia e Cultura Cientifica na Universidade de Évora; Maria da Saudade Baltazar, professora da Universidade de Évora e coordenadora do Mestrado de Sociologia e investigadora coordenadora do pólo da Universidade de Évora do CICS.NOVA da Universidade Nova de Lisboa e Maria Manuel Serrano, professora da Universidade de Évora e investigadora no SOCIUS – Centro de Investigação em Sociologia Económica e das Organizações  do Instituto Superior de Economia e Gestão da Universidade de Lisboa.

O Tribuna Alentejo conversou com a professora Ema Pires, da comissão organizadora, de forma a tentar perceber qual a importância deste texto de Weber, cem anos depois.

Tribuna Alentejo – Porquê Weber cem anos depois?

Ema Pires - A ideia surgiu do facto de ser interessante voltar a reler o texto de Max Weber na evocação da conferência em 1917. Passados cem anos o que tem ainda aquele texto para nos instigar a pensar naquilo que são as relações entre ciência e sociedade?

Um exemplo é o excerto da célebre conferência de Weber que passo a citar: “Como se configura, hoje, a ciência enquanto profissão, no sentido mais material do termo? Do ponto de vista prático, significa isto, em especial: qual é hoje a situação de um licenciado, decidido a consagrar-se profissionalmente à ciência, no seio da vida académica?”

É um texto ainda hoje com muita contemporaneidade para nós pensarmos o que é hoje ainda por um lado a potencialidade da ciência como vocação e por outro lado o universo de constrangimentos que se colocam ao jovem cientista ou jovem aspirante a cientista. 

O olhar de Weber sobre o contexto académico foi altamente motivado pela sua própria circunstância enquanto académico. O texto de 1917 reflete um pouco isso, isto é, a vocação para a ciência, numa altura em que por culpa da Grande Guerra a Europa estava a sofrer profundas transformações, sofrendo também essas transformações a própria academia europeia em contraponto por exemplo com o que acontecia na altura nos EUA, onde um cientista numa Universidade Americana tinha um processo de socialização profissional diferenciado daquilo que era o caminho concreto do Max Weber.  Comparação essa aliás constante no texto, visto que ao longo da mesma ele vai descrevendo como o capitalismo de Estado vai entrando dentro das Universidades e como isso também se estava a fazer visível naquilo que estava a ser a americanização da Universidade alemã.

Tribuna Alentejo – E Max Weber representou então o quê?

Ema Pires - Max Weber foi um académico que nós hoje poderíamos enquadrar como um dos fundadores da sociologia moderna enquanto campo científico. Contudo à data (Weber viveu no século XIX, princípio do século XX) a ciência não era compartimentada como hoje a concebemos. Ele era portanto um académico no sentido amplo do termo, escreveu sobre o que nós hoje consideramos economia, sobre sociologia e também sobre história. Estava entre estas três disciplinas, pois existiu antes dos campos serem marcados. É um dos pais fundadores da sociologia porque a sua abordagem aos fenómenos sociais é uma abordagem essencial para teorizar a sociedade enquanto realidade.

Teve uma vida académica pouco ortodoxa para os dias de hoje, no sentido em que não teve uma carreira académica linear com uma segurança laboral que permita fazer ciência com liberdade sem ser comprometida pelas circunstâncias próprias da vida. Pudemos dizer que Max Weber vivia uma precarização que nós hoje continuamos a viver. Fazer a ciência, ter a ciência como vocação continua a ser difícil. De que modo é que a maneira de olhar Weber sobre a vocação para a ciência pode ser olhado hoje à distância do tempo, mas com algumas condições que são próximas do que eram.

À data Weber conseguiu financiar a sua atividade académica em parte porque teve mecenas e essa circunstância permitiu-lhe que num contexto em que o Estado e a Universidade não custeava a cem por cento a sua atividade, continuar a desenvolver a sua ciência. Contudo hoje o mecenato científico pauta-se por critérios que são essencialmente outros!

Por isso muito do texto que o Weber proferiu naquela célebre conferência no início do século XX, continua na nossa opinião a fazer sentido ser relido hoje cem anos depois, num cenário também de transformações a vários níveis e em que as Universidades são partes integrantes nesses processos.

Tribuna Alentejo - E este seminário a quem é dirigido?

Ema Pires - O seminário é dirigido a toda a academia e comunidade em geral, sendo que em nossa opinião será uma grande mais-valia para todos aqueles que se querem iniciar numa carreira na ciência. Vai muito além dos alunos de sociologia, transcende muito o enfoque específico do campo da sociologia. Para a Sociologia Max Weber é um dos pioneiros fundadores da disciplina, por isso é nos caro por isso, mas a prova que o seminário extravasa esse campo é a fato da conferência final ser proferida pelo professor Augusto Fitas que vem do campo da física, uma ciência exata. O seminário terá início pelas 14:30 com a sessão de boas vindas, 15:00 tem início a mesa redonda constituída por quatro participantes e moderada pelo professor Eduardo Esperança. Dos quatro participantes fará parte o Luís Almeida, licenciado em Sociologia que venceu o prémio da Fundação Eugénio de Almeida para o melhor estudante de sociologia. O Luís personifica um pouco o desafio que se coloca hoje para tentar fazer ciência, visto que trabalha diariamente numa atividade que nada tem a ver com a sua prática científica.

Posso também adiantar que Rosário Mauritti, também presente na mesa redonda, vai trazer dados sobre a precarização da ciência em Portugal. Como e de que modo se produz hoje ciência em Portugal prova de que o mesmo é abrangente e atinge todas as ciências.

O texto proferido por Max Weber na célebre conferência de 1917 pode ser lido aqui, leitura que aconselhamos, aliás, consideramos mesmo obrigatória.