23 Março 2016      20:26

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ATÉ QUE NOS BATAM À PORTA!

Pura Idiossincrasia

O terrorismo foi-nos apresentado a muitos de nós, maioritariamente à minha geração, protagonizado nos grandes ecrãs pelos atentados de 11 de Setembro de 2001. Até à data arrisco-me a afirmar que pouca era a preocupação e conhecimento da população ocidental acerca deste tema, tão febril nos dias de hoje. Sabia-se que o terrorismo existia sim, mas “era coisa de terceiro mundo”, o tipo de desastre que só acontece aos outros…Porém hoje ele é tema bastante presente na nossa sociedade, senão até, o principal dos problemas da população ocidental. O terrorismo de outrora perdeu a sua dimensão espacial e temporal, não tem geografia, não tem nação, não tem raça e muito menos sentido tem. Orientado por ideais radicais assume uma forma completamente diferente daquela que conhecíamos. Hoje o terrorismo está na nossa casa, dentro das nossas fronteiras e torna-se cada vez mais imprevisível a sua ação.

Numa primeira instância gostaria de afirmar que sou um assumido europeísta. Acredito que o projeto europeu trouxe imensos benefícios para o desenvolvimento dos seus Estados-Membro, tanto a nível económico como a nível social e político. Mas acredito também que ainda existem muitos “nós por dar” para que a Europa se torne num organismo ainda mais estável e que sobretudo transmita segurança aos seus cidadãos.

Também não sou “anti-refugiado”, se é que existe uma expressão que faça sentido defini-lo. Penso que a União Europeia tem o dever e a obrigação de ser um agente presente na esfera internacional no que toca à prestação de auxílio aqueles que tentam desesperadamente, muitas vezes perdendo as suas vidas, fugir das mesmas pessoas que hoje nos estão a atacar. Pessoas essas que não sua essência são extremistas do DAESH. Grande maioria deles são claramente pessoas afetadas pelos órgãos de extremismo islâmico, não tendo qualquer tipo de ligação a organizações de carácter terrorista.

Hoje a Europa chora mais uma perda, vive o luto por mais cidadãos que se tornaram vitimas de atos tão cruéis e desumanos que violam a dignidade e a liberdade do ser humano, corrompem a democracia e instauram o medo. Já fomos Madrid, já fomos Paris, hoje somos Bruxelas, quem seremos a seguir?

A Europa e as suas instituições precisam de redefinir a sua estratégia de defesa externa e interna. Uma estratégia comum que vise a defesa de todos os europeus para que os mesmos não se sintam inseguros na sua própria “casa”. Urge em agir uma vez que a ameaça não se encontra lá fora mas sim dentro das nossas fronteiras, uma vez que o terrorismo perdeu a sua definição geográfica e o mesmo parece estar, irmãmente dividido, por todos os grandes centros e capitais da Europa. Para além de Charlie temos de também de ser nós próprios, sentir o que é ser europeu, sentir que temos de defender o nosso território, a nossa liberdade e que não podemos abrir mão desses mesmos valores.

A União Europeia sempre teve como pilar da sua fundação, para além da cooperação económica, a promoção da paz de toda a esfera internacional bem como no apaziguamento de potenciais conflitos que pudessem surgir entre os seus Estados-membro. Urge que este pilar volte ao topo da lista de prioridades da UE. A descontrolada liberalização da entrada de refugiados, bem como a abertura descuidada das fronteiras e o posterior descuido no controlo dos potenciais indivíduos com ligações a organizações terroristas, deixaram-nos em certa parte vulneráveis a potenciais ameaças e certamente facilitaram o planeamento de atentados por parte dos corpos terroristas. Mesmo sendo vigiados e estando "debaixo d'olho", os mesmos conseguiram delinear estratégias de implementação do terror como aconteceu em Bruxelas. Já se sabia que os indivíduos eram potenciais terroristas. Previu-se mas não se evitou.

São necessárias reformas. Mas estas mesmas reformas não passam só pela reforma institucional mas em grande parte pela reforma no “modo de estar”. A Europa está em guerra, tem de assumir isso em primeira instância e tem de assumir também que o seu principal inimigo não tem território, usando por sua vez o nosso próprio território como meio de propagação. O fator de falta de geografia desta ameaça torna fundamental a promoção de reformas legais que permitam a investigação e controlo de potenciais ameaças. É fundamental também que se aumente o investimento nos serviços de inteligência para que estes sejam capazes de detetar quaisquer tipo de iniciativa de cariz terrorista que possa colocar em causa vidas humanos ou prejuízos morais. Este tipo de reformas mostram-se cruciais para que consigamos agir. Só assim iremos restaurar a esperança no projeto europeu e só assim conseguiremos que os cidadãos se sintam seguros dentro do seu espaço.

Sendo Bruxelas a capital da União Europeia e de todas as suas instituições podemos assumir, com uma certa vergonha, que o nosso coração foi atacado. O inimigo não terá limites nem demonstrará certamente piedade. Fará tudo o que tiver ao seu alcance para instaurar o medo e criar um clima de insegurança e instabilidade. O auto proclamado Estado Islâmico já assumiu a autoria destes atentados dizendo que o pior está ainda para vir e que não irão parar por aqui. O que fazemos nós? Vivemos o luto dos nossos compatriotas atirando culpas ao mais diversos agentes? Criaremos uma espécie de movimento humanista, pelas redes sociais, em que façamos sentir o pesar pela morte das vítimas dos mais recentes ataques, como fizemos com Charlie Hebdo e Paris? Faremos isto vezes e vezes sem conta apenas para alimentar as massas sociais? Levantaremos a nossa guarda por breves instantes, enquanto a “chapa está quente” e depois voltaremos a reduzir a guarda quando as coisas parecem estar mais pacíficas? Fica-nos bem sermos humanistas sim, fica-nos bem também prestar luto quando sentimos que a dignidade humana foi atacada. Mas fica-nos melhor ainda termos uma estratégia de intervenção para que tentemos evitar ao máximo custo ter de rezar mais uma vez pela perda da vida de inocentes.

Fomos Charlie, fomos paris, somos Bruxelas. Seremos tantos mais até quando? Até que nos batam à porta? Eles já estão à entrada do nosso quintal, a diferença é que não irão tocar à campainha, irão entrar de rompante… Europa, está na hora de agir ao invés de reagir!

Imagem © AP Photo/ Geert Vanden Wijngaert