30 Abril 2015      11:33

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O SILÊNCIO NA COMUNICAÇÃO

PUXAR PELA LÍNGUA

Os sistemas culturais, de que fazemos parte e para os quais contribuímos, são em grande medida sistemas de comunicação, constituindo a linguagem um dos seus meios mais importantes.

Na primazia que normalmente lhe concedemos, nas interacções interpessoais e interculturais que mantemos, não poderemos (nem deveremos), contudo, ignorar outro meio não menos relevante e que a intersecta: o silêncio.

Na verdade, e não querendo aqui conduzir o leitor a complexos meandros teóricos que subjazem a um e a outro, consideremos os vários níveis de uso linguístico que o silêncio atravessa e que assumem importância em aspectos sociais, políticos ou emocionais por que nos regemos, como indivíduos e como comunidades. Nas várias vertentes em que se revela, e sendo talvez a forma mais ambígua de todas as formas linguísticas, distinta de outros aspectos do comportamento não-verbal - como sejam os gestos, as expressões faciais ou os padrões proxémicos - o silêncio, na sua relação com o discurso, pode, nesta medida, não significar simplesmente ausência de algo, ao contrário do que se depreende das definições que o dicionário dele dá.

Será, pois, necessário atentar na sua relevância ou irrelevância comunicativa, nas suas qualidades positivas e negativas, à semelhança, aliás, do que os falantes fazem em relação ao discurso que produzem ou que recebem. Com efeito, por um lado, o silêncio poderá ser de utilidade quando, por exemplo, o falante pretende ser bem-educado ou fazer uso de actos de fala indirectos, permitindo, assim, opções de interpretação ao seu interlocutor (podendo, porém, a forma indirecta ser geradora de ambiguidade e potenciar incompreensão ou mesmo alguma forma de conflito), ou quando pretende ganhar tempo na resposta a dar ao que se disse anteriormente, ou ainda quando, por este meio, pretende enfatizar argumentos e ideias, de forma a impressionar o Outro e a obter aplauso, estratégia esta que frequentemente é usada em discursos políticos.

Por outro lado, o silêncio poderá ser interpretado como sinal de ansiedade, hostilidade ou ignorância. Não será, pois, por acaso que em entrevistas a políticos, por exemplo, as pausas não-silenciosas sejam praticamente inexistentes. Sabendo-se, embora, que será mais fácil desfazer silêncio do que palavras proferidas…

Juntemos a este conjunto de referências, aqui forçosamente muito sucinto, o uso de estrangeirismos em vários domínios do quotidiano, os quais podem induzir silêncio na comunicação. Sobre este assunto debruçar-nos-emos mais tarde.

Uma nota final se impõe sobre a natureza multifacetada do silêncio. Se é verdade que um qualquer falante de uma qualquer língua-cultura lhe apraz ou é compelido a produzir silêncio em determinadas situações - porque esse meio significa e comunica - não podemos deixar de registar, e simultaneamente reprovar, a imposição de medidas silenciadoras a pessoas ou a grupos, de qualquer género, raça ou credo, como forma de sobre eles se exercer controlo político e social.

Olga Baptista Gonçalves*

Docente da Universidade de Évora

*A autora não adopta o novo acordo ortográfico.