28 Outubro 2015      17:18

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NÓS, AS PESSOAS…

Todos os sistemas políticos, passados e presentes, parecem sofrer de avareza e abuso de poder, contudo, a democracia é o único regime político capaz de proporcionar e valorizar a dignidade da pessoa humana.

A democratização está longe de ser um processo linear. A democracia constrói-se e é um processo que requer tempo e paciência, que não se alcança somente através da realização de eleições. A democracia não é uma questão de tudo ou nada, mas sim um processo contínuo de mudança, orientado para a humanização da sociedade e dignificação da pessoa humana.

Neste contexto, aproveito para transcrever o artigo 1.º da Constituição da República Portuguesa: “Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária”. Logo, a dignidade da pessoa humana constitui-se como o valor fundamental e basilar da nossa democracia.

A este respeito e para reforçar este conceito recorro a uma das ideias centrais no pensamento de Kant, expresso na obra “Fundamentação da Metafísica dos Costumes”, que consiste precisamente na submissão do poder ao direito e da submissão do direito à moral, mais concretamente refiro-me ao imperativo prático: Age de tal maneira que uses a humanidade, tanto na tua pessoa como na pessoa de qualquer outro, sempre e simultaneamente como fim e nunca simplesmente como meio.

Bem sei que a ganância e altruísmo são traços de personalidade que um sistema político não pode mudar, mas a força coletiva dos cidadãos pode inibir (ou promover) a ativação desses traços de personalidade. Por isso é tão necessária a adoção de práticas democráticas nos pequenos gestos do dia-a-dia.

Em democracia, o exercício do poder político tem de respeitar a Lei, a Constituição e a Vontade do Povo através das decisões dos seus representantes eleitos, pelo que deveremos ser capazes de rejeitar a ideia sobre a expectativa de obter proveito próprio com uso de outrem como meio. No reino dos fins tudo tem um preço ou uma dignidade. E a dignidade acompanha o homem ou a mulher até à sua morte.

Por outro lado, a dignidade da pessoa humana, como fundamento do Estado Democrático de Direito, reclama justiça social, equidade, liberdade, solidariedade, paz social, bem-estar e qualidade de vida. Nestes termos, todas as pessoas têm o direito de viver a sua vida com dignidade e livre do medo, com uma parte justa dos recursos do nosso país e com igualdade de opinião.

A democracia cresce em nós, as pessoas... e desenvolve-se com o nosso direito de pensar e de agir sem qualquer interferência pessoal ou política. A vitalidade da democracia alimenta-se da credibilidade da política e a sua revitalização faz-se através da permanente reinvenção, quer das formas do discurso público quer da prática política, bem como através da participação dos cidadãos e do direito de opinar sobre o modo de como somos representados ou governados.

No entanto, a dura realidade demonstra que os cidadãos, cada vez mais, se distanciam do debate público e até da participação cívica. O que, desde logo, agrava o perigo do populismo perpetuado pelos efeitos nefastos da retórica, fundamentalmente no que diz respeito à manipulação da vontade popular e naturalmente na capacidade primária de perverter a democracia, o que nos obriga a repensar e procurar novas soluções para o exercício da cidadania.

Recuso-me a admitir que a política se tenha tornado numa atividade suspeita, sinónimo de oportunismo e de corrupção. Prefiro abraçar a política sob a égide da confiança, como atividade de respeito e de prestígio, na busca desinteressada do bem comum, capaz de escutar e envolver solidariamente todos os cidadãos.

O primado da verdade na política é confiança e sem confiança não temos nada.