29 Setembro 2016      07:56

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O BOM ALUNO

O Bom Aluno: do arauto da austeridade à desigualdade como imagem de marca

Há sensivelmente 5 anos fomos confrontados com a erupção de um guru da austeridade, uma espécie de publicano da nova era, com um pensamento neoliberal de fazer inveja aos manuais e obras do assunto. A receita, feita numa folha de excel, era simples: cortar e reduzir em tudo que aparecesse à frente, sobretudo no que era mais fácil e volumoso - funcionários públicos e na esmagadora maioria dos portugueses que tem no trabalho a sua única fonte de rendimento. Ah, e toda esta receita milagrosa tinha por base os pressupostos infalíveis da Troika. Ele – o guru da austeridade – disse-nos que esquecêssemos a “espiral recessiva” porque iriamos crescer acima da média. Pois bem, a receita e a estratégia falharam como aqueles castelos de cartas, com uma nunce este não passou de um único patamar antes de se desmoronar.

Mas não tínhamos apenas o Bom Aluno Pedro, sempre coadjuvado pelo companheiro de carteira Portas, tínhamos mesmo um dos melhores alunos da Europa. Quantas vezes o exemplo português foi apontado como referência no quadro de países em assistência financeira? Quantos de vocês não se lembram das medidas e reformas levadas a cabo pelo anterior governo serem elogiadas pelos quadros de referência da União Europeia?

Pois bem. Com uma leitura atenta ao belíssimo estudo coordenado pelo Prof. Carlos Farinha Rodrigues, Desigualdade do Rendimento e Pobreza em Portugal, temos as verdadeiras respostas para a avaliação dos anos das políticas restritivas e austeritárias. Ficamos claramente com a noção que os últimos anos e as políticas públicas subsequentes foram claramente erradas e uma promessa falhada, com o sacrifício de milhares de famílias, com a pobreza a bater à porta dos jovens e com o rendimento do trabalho baixar vários pontos percentuais.

Vamos então analisar os números como eles são, frios e duros. Entre 2009 e 2014 a taxa de pobreza aumentou de 17,9% para 19,5%. Nas crianças e jovens este aumento foi ainda mais significativo, pela sua expressão, passou de 22,4% para 24,8%. Isto significa que dos 2,5 milhões de portugueses que em 2014 se encontravam em situação de pobreza, havia uma grande fatia de crianças e jovens. Há fatores que explicam bem estes números - 69% dos indivíduos viram o seu rendimento diminuir entre 2009 e 2014. A pergunta que se impõe: o que temos se misturarmos aumento do desemprego, cortes nos salários e nas prestações sociais e o aumento da tributação dos rendimentos e pensões? A resposta é dada pelo estudo – “a verdadeira imagem de marca das políticas de ajustamento seguidas”.

Passado um ano das eleições legislativas, com todas as vicissitudes que tivemos durante este período, o que aconteceu ao Bom Aluno? Enveredou por outra arte, a de Profeta da Desgraça. Mas também aqui as coisas não lhe estão a correr bem. O Diabo teima em não descer à Terra, sobretudo com os últimos indicadores revelados pelo INE. No espaço de um ano o atual governo conseguiu uma redução de 1,8% no défice homólogo e o défice no final do ano pode mesmo ser inferior aos 2,5% recomendados pela Comissão Europeia.

Não quero isentar de responsabilidades os anteriores governos até ao que foi chefiado pelo Bom Aluno. Mas sem qualquer sombra de dúvidas, a legislatura anterior, que ergueu o chavão da austeridade, trouxe consigo um enorme rasto de pobreza e desigualdade que fez Portugal regredir vários anos no seu processo de desenvolvimento social. Este estudo é claro neste sentido e serve para desfazer alguns mitos que foram trazidos à opinião pública. As políticas de austeridade não isentaram as classes mais baixas e, pior, a crise foi sobretudo sentida pela classe média! Quem apregoava a austeridade pode agora colar por cima a imagem da desigualdade no país.

Imagem de capa retirada daqui.