24 Julho 2016      16:45

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INTELECTUAIS DE ALGIBEIRA

"INCONSTÂNCIAS"

A expressão que dá nome a este artigo chegou-me da maneira mais inocente que possam imaginar. Ainda hoje acho que se não me tivesse chegado, tal como as elucidações espontâneas com o seu momento de dúvida (quero com isto de dizer não me ofereçam ainda à forca como habitualmente fazem), olharia com certeza de forma diferente para o que muitos sabem e outros tantos ignoram.

A verdade é que existem, até no meio das letras e artístico (principalmente no meio das letras e artístico!), certas figuras que lembram personagens saídas de uma comédia de mau gosto ou até de um drama demasiado verde para o género. Transfiguram-se num galo- as mãos enfiadas nas algibeiras como as asas juntas ao corpo, o peito erguido ao céu qual papo saliente e lustroso, o nariz apontado ao Senhor como o bico pontiagudo, todo um olhar de desprezo contido num sorriso maléfico que só imaginamos num galo, se este realmente o tivesse – ou, como se diz correntemente: num “galarote”.

Toda esta imagética aquando o meu encontro com ela me pareceu disparatada, quase cómica. No entanto ao observá-la depreendi que mais prontamente se mostra grotesca e meritória de tristeza. Neste momento penso para mim: andaram escritores a falar de humildade durante séculos, a gastarem tinta, folhas, paciência e experiência para que o século XXI mais uma vez os destituísse da sua plena valorização. Aquilo que é tido como nobre para esta nova classe social semi-instituída passa tão só e apenas pelo poder de compra e pagamento aliado a um provável complexo de inferioridade arrecadado nos confins de uma idade que chegou ao fim e nunca se ultrapassou, tudo isso traduzido na mania errónea de se ser  o supremo juiz do supremo tribunal da suprema cultura.

Sim, a arte pretende tornar-nos maiores mas não através de um meio elitista e cruel. Cruel porque inúmeras vezes destrói caminhos que estão no seu início para alimentar um ego que se forma a partir de uma ilusão pessoal e afectada de cargos sociais que nada têm que ver com critérios de avaliação artísticos, culturais ou literários. Esses critérios, nem os seus génios têm a noção quais são e essa é a parte bela destas áreas. – A liberdade, o meio, o estar entre.

Essa liberdade é o que nos faz ser melhores. É o que nos faz ter as melhores ideias e arriscar uma evolução. Dá-nos, principalmente, tempo. Só um escritor, um artista sabe como o tempo é precioso. Como a correria é tendenciosa e inimiga do cuidado que é preciso ter-se com o processo criativo que se aproxima em muito da magia com os seus rituais próprios.

O intelectual de bolso é aquele que consome o produto mas não sabe meditar no seu processo de formação. Não tem a curiosidade e a compreensão necessárias para lhe ler as dores e as alegrias para lá da sua materialidade e do troféu que dele faz. É por isso que o intelectual de bolso se pavoneia por meio de neologismos caros numa conversa simples – por não saber aceder ao lado primitivo das ideias simples a que dão nomes complicados. Chamam-se de bolso principalmente porque são pessoas de que não nos recordamos após uma e outra conversa (não positivamente) tal como os objectos que ficam perdidos e amachucados no fundo dos bolsos – andam connosco todo o dia mas é-nos indiferente que o façam. Se fosse eu tinha-os chamado de intelectuais-carraça: importunos, aborrecidos e oportunistas. Agarram a felicidade do sucesso de outrem para limpar os seus pés e rebelarem-se contra si mesmos.

O que nos faz falta são pensadores, não inquisidores frígidos - esses um dia vão ser chamados de intelectuais de bolso.

 

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