3 Agosto 2016      07:01

Está aqui

A CULTURA: A UM PÍXEL DO PROGRESSO

Esta crónica poderia ter como título: A Cultura, a um píxel do progresso ou a necessidade de uma nova vaga arejada e permanente para o avanço das políticas culturais. Neste particular, a campanha “Vamos por o Sequeira no lugar certo” foi uma agradável surpresa de envolvimento da cidadania nas políticas culturais, mobilizou o país em torno de um objetivo comum – a aquisição de um píxel para colocar o quadro de Domingos Sequeira, da série Palmela, no Museu Nacional de Arte Antiga. Num cenário em que existem também novos projetos que conferem um grau de inovação marcante na transformação que temos de promover em Portugal, a cultura como outras áreas tem de se libertar das amarras administrativas e burocráticas a que está sujeita e eternamente dependente.

Em abril lembro-me de comentar um artigo do Público intitulado: “O poder central devia estar mais presente na cultura? Devia, mas as câmaras dão conta do recado”. Nesta peça eram abordados diversos casos em que as Câmaras têm sido promotoras de projetos culturais de grande relevância no plano nacional, produções de grande qualidade e também com um grande orçamento, que apenas são uma realidade com o forte apoio dos orçamentos municipais. É verdade que os Municípios têm feito o seu papel num contexto em que o Poder Central não tem meios e recursos para uma Promoção Cultural, de qualidade e eficaz, em todo o território nacional. Também é verdade que as Câmaras do interior têm um trabalho mais difícil e em certa medida de duplo esforço. E, por fim, que dentro do quadro institucional as autarquias têm assegurado muitas iniciativas nos seus territórios, no entanto têm beneficiado muito de outras organizações, ainda que de forma desconexa, têm feito um trabalho incrível e conseguido aquilo que muitas vezes parece uma miragem - a autossustentabilidade destes projetos.

Se existem setores, como a Cultura que tem organismos e programas rígidos e não garantem uma dinâmica adequada aos novos tempos, por outro lado existem áreas como o Turismo em que se criaram estruturas bastante dinâmicas para a sua promoção e dinamização. Imaginem, hipoteticamente, para quem conhece o trabalho na área do Turismo desenvolvido pela Entidade Regional do Alentejo, que existiria uma estrutura semelhante para a Cultura. Para a verdadeira Cultura, a que é capaz de chegar a vários públicos e ao mesmo tempo gerar retorno no território, criar mais-valias na interação com os agentes locais/regionais e ter como fim último a transformação e o desenvolvimento social. Já imaginaram? Era um avanço muito interessante.

Conto que a descentralização que o Governo está a promover possa chegar aqui. Não são precisas mais pessoas, apenas as certas e conhecedoras da realidade, que em conjunto com as autarquias, associações e instituições (não esquecer o INATEL) possam levar a cabo programas de excelência que marquem a oferta no nosso território. Sei bem que isto não chega. Precisamos também de arranjar formas alternativas de financiar e procurar garantir a sustentabilidade dos investimentos em cultura. O “Sequeira” foi uma experiência interessante. Mas existem outras…

O exemplo principal que aqui quero deixar é a organização do Festival Internacional de Música de Marvão, que teve lugar entre os dias 22 e 31 de julho. Como bem descreve Chistoph Poppen, a quem Marvão e o Alto Alentejo estarão sempre gratos, este Festival que é obra de uma pessoa (para sermos sinceros e rigorosos), tem na sua génese e prossecução uma base comunitária forte, envolvimento de associações e trabalho voluntário que muito tem contribuído para a sua afirmação e crescimento ao longo de três edições. Esta organização independente e autossuficiente, que não se limitou a ficar na esfera da autarquia, alcançou mais de 4 mil espectadores este ano, alargou o seu cartaz a Espanha e atingiu um grau de maturidade, como estrutura, de fazer inveja a muitos outros eventos de âmbito nacional.

Na Cultura o caminho andará próximo disto: apostar em soluções sustentáveis, descentralizar com qualidade e desburocratizar com critério.

Imagem de capa daqui.